Estação derradeira

As opiniões são como os narizes, toda a gente tem um. E alguns cheiram melhor que os outros? Isso também. Seja como for, o momento presta-se a opiniões fortes sobre as coisas. Não basta ter opiniões. É preciso que sejam fortes. E depois há o epítome do indivíduo opinativo que é a pessoa frontal. Alguém que não só tem opiniões fortes – ou fortes opiniões se for um tipo intelectual – como também está convencido que somos todos obrigados a satisfazer a sua auto-indulgência. Resumindo: a aturá-los.

Pessoas fortemente opinativas têm habitualmente gostos de enorme exigência. A sofisticação requer que tudo seja separado em duas categorias: a excelência e a inanidade. Tipo, Lars von Trier: excelente. Exterminador Implacável: inanidade. Sinceramente, prefiro aturar pessoas efectivamente estúpidas. Estúpidos ignorantes. Em vez de estúpidos cheios de literacia. Sabem, como aquele tipo que escreveu no IMDB que os primeiros trinta minutos do 2001 Odisseia no Espaço era só macacos.

Voltando ao princípio, como eu dizia, o momento é propício ao exercício da opinião. Nos blogues isso não é novidade. Se os chico-espertos voassem a blogosfera era um aeroporto. Mas a doença alastrou-se rapidamente ao meio jornalístico e à política. Um dos sintomas é o modo como tudo é óbvio. Não sei se já repararam? Mas nos discursos, nos comentários, as coisas são sempre obviamente. Tipo: já todos sabíamos que; eu já tinha avisado; nem podia ser de outra forma. Há mesmo uma espécie de campeonato para ver quem é o vencedor do prémio de quem já tinha dito mais vezes há mais tempo que ia ser mesmo assim.

É curioso porque viver em Portugal nos últimos, vá lá, oito anos, foi como circular a bordo de um comboio desgovernado em direcção ao fim da linha. Por lá vagueavam meia dúzia de malucos a avisar que ia haver um grande acidente, mas estava o resto do pessoal todo no vagão-restaurante a beber cocktails e a fazer tchim-tchim. Lá estão outra vez estes chatos, pá. Que desagradável, ao longe, esta voz de Cassandra

Profecia, ou ironia do destino, bem nos avisaram os Gregos da antiguidade. Cassandra, condenada a que ninguém acreditasse na sua palavra, tinha, afinal, razão. Agora eis-nos descarrilados para lá da estação derradeira, rodeados em escombros, e todos esbracejam e fazem ouvir a sua voz. Como foi isto possível?

Opiniões fortes?