|exupéry|

Segunda-feira

Muito embora as palavras continuem a ser as mesmas, as noções de separação, de ausência, de distância, de retorno, já não contêm as mesmas realidades. Para a compreensão do mundo de hoje, usamos uma linguagem criada para o mundo de ontem. E afigura-se-nos que a vida do passado parece corresponder melhor à nossa natureza pela única razão de corresponder melhor à nossa linguagem.





Imagem do livro Saint-Exupéry - Le Dernier Vol, de Hugo Pratt. Posted by Hello

Se julgamos que a máquina deita o homem a perder, é talvez porque necessitamos de recuar um pouco para apreciar os efeitos de tão rápidas transformações como aquelas por que temos passado. Que são os cem anos da história da máquina, à vista dos dois mil e cem anos da história do homem? Quase que ainda nos não instalámos nesta paisagem de minas e de centrais eléctricas. A bem dizer, mal começámos a habitar esta casa nova que nem sequer acabámos de construir. Tudo mudou tão depressa à nossa volta: relações humanas, condições de trabalho, costumes. A nossa própria psicologia foi abalada nas suas bases mais profundas. Muito embora as palavras continuem a ser as mesmas, as noções de separação, de ausência, de distância, de retorno, já não contêm as mesmas realidades. Para a compreensão do mundo de hoje, usamos uma linguagem criada para o mundo de ontem. E afigura-se-nos que a vida do passado parece corresponder melhor à nossa natureza pela única razão de corresponder melhor à nossa linguagem.
Cada progresso nos empurrou um pouco mais para fora de hábitos que mal acabáramos de adquirir, e em boa verdade somos emigrantes que ainda não fundaram a sua pátria.
Somos todos bárbaros jovens a quem os novos brinquedos ainda deslumbram. Outro significado não têm as corridas de aviões. Aquele sobe mais alto, corre mais depressa. Esquecemos por que motivo o fazemos correr. Temporariamente, a corrida sobreleva ao próprio objectivo. E é sempre a mesma coisa. Para o colonial que funda um império, o sentido da vida é conquistar. O soldado despreza o colono. Mas o alvo dessa conquista não era a fixação desse colono? Assim, na exaltação dos nossos progressos, temos obrigado os homens a trabalhar como escravos no assentamento de vias férreas, na construção de fábricas, na perfuração de poços de petróleo. Esqueceramo-nos um pouco de que levávamos a efeito esses trabalhos para servir os homens. Enquanto durou a conquista, a nossa moral foi moral de soldados. Mas agora, é-nos mister colonizar. É-nos mister tornar viva essa casa nova ainda sem rosto. A verdade para um foi construir, para outro é habitar.

Pouco a pouco, a nossa casa há-de tornar-se mais humana. A própria máquina, quanto mais se aperfeiçoa, mais se apaga à sombra do seu papel. Dir-se-ia que todo o esforço industrial do homem, todos os seus cálculos, todas as suas noites de vigília sobre os desenhos, não conduzem, ao que parece, senão à mera simplicidade, como se fosse precisa a experiência de várias gerações para, a pouco e pouco, dar forma à curva duma coluna, duma quilha ou da fuselagem dum avião, até lhes transmitir a pureza elementar da curva dum seio ou duma espádua. Tem-se a impressão de que o labor dos engenheiros, dos desenhadores, dos calculadores dos gabinetes de estudos não será, portanto, na aparência, senão o de polir e encobrir, aligeirar esta juntura, equilibrar esta asa, até não darmos já por ela, até deixar de ser uma asa presa a uma fuselagem, para se tornar uma forma perfeitamente desabrochada, liberta enfim da sua ganga, uma espécie de conjunto espontâneo, misteriosamente coeso e de natureza análoga à do poema. Daí a ideia de que a perfeição é alcançada não quando nada mais há a acrescentar, mas quando nada mais há a suprimir. No fim da sua evolução a máquina dissimula-se.
A perfeição do invento confina assim com a ausência do invento. E do mesmo modo que no instrumento toda a mecânica aparente a pouco e pouco desapareceu, e nos é entregue um objecto tão natural como um seixo polido pelo mar, é igualmente admirável que, até no seu próprio emprego, a máquina se faça a pouco e pouco esquecer.
Outrora achávamo-nos em contacto com uma fábrica complicada. Hoje, porém, esquecemo-nos de que um motor está em funcionamento. Ele corresponde afinal à sua função, que é a de rodar, como o pulsar dum coração, e nós nem sequer atentamos no pulsar do nosso coração. Essa atenção já não é absorvida pelo utensílio. Para além do utensílio e através dele, é a velha Natureza que tornamos a encontrar: a do jardineiro, do nauta ou do poeta.

[Antoine de Saint-Exupéry em Terra dos Homens]

|mediatectura|

Quinta-feira

Cada vez mais se assiste à fusão do design e da arquitectura. A pouco e pouco as formas, a sinalética, os momentos de interacção do espaço com o indivíduo são marcados pelas regras do design. Um caso interessante é o trabalho da equipa alemã ag4 que apresenta um conjunto de projectos notáveis sob um novo conceito: mediatectura. Dos muitos exemplos visitáveis na sua página de internet está este “ARD Media Portal”, um objecto de design funcional destinado a providenciar toda a informação ao utilizador de um determinado espaço, ou seja, uma estação informativa. Trata-se de uma peça de mobiliário modular que pode estar isolada ou ser agrupada em módulos de vários tamanhos, criando espaços mais complexos. Uma ideia do que pode vir a ser a paisagem urbana do futuro.


ARD Media Portal, 2002. AG4 Mediatecture Company. Posted by Hello

|massa|construída|

Quarta-feira

Penso que a arquitectura não nasce de uma ideia formal, mas da vontade de contar a história de um lugar e das pessoas que o habitam. Esta é a história de uma família jovem com dois miúdos que resolveu construir a sua casa. Da autoria da firma AWG – AllesWirdGut Architektur, o projecto está implantado num lote situado no perímetro de um jardim e desnivelado da rua por um muro de suporte de dois metros e meio de altura. Por restrições legais, a única faixa ocupável era exactamente a adjacente à via, pelo que a casa teve de se articular com os diversos níveis de implantação e acesso, elevando-se através de uma massa construída que rasga aberturas para o interior ajardinado. É um projecto cheio de atmosferas, transições contínuas e uma interacção complexa entre o interior e o exterior. O resultado é qualquer coisa de musical, único, inovador, mas estranhamente enraizado no “lugar”, algo que só podia ter acontecido ali e em nenhum outro sítio.


Casa unifamiliar em Viena, Áustria, 2003. AWG - AllesWirdGut Architektur. Posted by Hello

|y|house|

Terça-feira

Situada no topo de uma colina, a “Y House” da autoria de Steven Holl prolonga a geografia do sítio dividindo-se em dois braços que terminam em varandas. O “Y” corta o céu e aproxima o sol até ao coração da casa. A sua forma crua faz uma marca primitiva no vasto território e é acentuada pelo jogo geométrico de composição dos vãos que é uma das marcas do seu autor, decompondo a noção dos pisos e a escala do objecto.


Y House, Catskill Mountains, New York, 1999. Steven Holl. Posted by Hello

|baeza|

Segunda-feira

A gravidade constrói o espaço, a luz constrói o tempo, e dá razão ao tempo. Estas são as questões centrais da arquitectura: o controlo da gravidade e o diálogo com a luz.
Alberto Campo Baeza


Gaspar House, Cadiz, 1992. Alberto Campo Baeza. Posted by Hello

|as|duas|faces|de|um|fórum|

Sexta-feira



[Patrícia Santos Pedrosa, via email]
Daniel,
lamento mas não posso discordar mais.
O dito fórum das culturas é tudo menos uma novidade.
É, realmente, uma velha forma de deixar que o dinheiro
vampirize a cidade.
Nem as culturas, nem a sociedade plural, nem a cidade
estão aqui em causa... Só entra quem paga, só fala
quem é convidado e a cidade feita é má, triste e Barcelona
não merecia um final assim para a Av. Diagonal.
Um abraço,
Patrícia

patrícia santos pedrosa
[arquitecta/investigadora - upc.etsab]
Barcelona


Projectos em curso, obras em casa, enfim, a desorganização habitual e o blog tem-se mantido com divulgação apenas, deixado por assim dizer em modo “Acontece”. Quando me foi dado a conhecer o grande evento em curso a propósito do Fórum Barcelona 2004 fiquei entusiasmado, deslumbrado ainda mais pela sua interessante página de internet. De resto, só mesmo uma grande desatenção poderia justificar o meu desconhecimento total do acontecimento mesmo até ao dia de abertura. Eis então que este email da Patrícia me veio despertar para a polémica por detrás do Fórum que eu julgara tão consensual e pacífico. Resolvi investigar...

Debaixo do slogan “um evento que vai mover o mundo” iniciou-se o maior acontecimento europeu do ano, quatro meses e meio de exposições, conferências e espectáculos naquele que se proclama como “o ponto de encontro para todos os cidadãos do mundo” e um espaço de debate de ambiciosos temas geopolíticos: o Fórum Barcelona 2004. No seu coração está o edifício principal, símbolo maior do empreendimento, projectado pelos arquitectos suíços Jaques Herzog e Pierre de Meuron que se localiza exactamente no topo da Diagonal, a grande avenida que divide Barcelona ao meio até ao mar. A vista aparentemente infinita deste eixo termina agora no impressionante edifício de Herzog e de Meuron, que sob certa luz se parece desvanecer na água que o envolve.
Anunciado como um evento sem precedentes com mais de 1500 espectáculos, incluindo mais de 400 concertos e 45 conferências em torno dos três grandes temas do fórum, “Diversidade, Paz e Desenvolvimento Sustentável”, o projecto foi ainda assim alvo da desistência de alguns organizadores e a recusa de muitas organizações não governamentais e locais em participar no projecto, levantando dúvidas sobre a autenticidade dos seus temas e as motivações financeiras que o sustentaram.

Apoiado pelos diversos níveis da administração pública (o município de Barcelona, o governo da Catalunha e a administração central do estado espanhol), o F2004 obrigou ao estabelecimento de contratos de parceria com grandes companhias privadas de modo a cobrir as despesas de um tão grande empreendimento. Numa tempestade de controvérsia, foi decidido que o “Fórum das Culturas” seria financiado por corporações multinacionais como a Telefónica, a companhia eléctrica Endesa, a Iberia, o El Corte Inglés, a Toyota, a companhia bancária La Caixa, a Nestlé, a Coca Cola, e finalmente a (menos publicitada) Indra Information Technology. Se algumas destas empresas se revelaram polémicas por simbolizarem alguns dos receios em torno dos processos de globalização, esta última (Indra) mereceu uma atenção especial uma vez que esta corporação efectua a maior parte dos seus lucros pelo desenvolvimento de tecnologia militar – contraditório a um fórum que se pretende comprometido com o diálogo sobre a paz mundial.

O evento foi também o pretexto para um projecto maciço de “renovação urbana” de proporções nunca antes vistas: nada menos que a requalificação do inteiro norte costeiro da cidade. Assim começaram os trabalhos de planeamento para aquele que se viria a chamar o “District 22@” ou a “cidade do conhecimento” como lhe chamam os seus promotores. No outro lado da polémica esteve a necessidade de demolir uma quantidade apreciável de edifícios antigos ou históricos e a expropriação de milhares de residentes. No seu lugar, o novo “District 22@” prepara-se para vir a oferecer hotéis, centros comerciais, torres de escritórios e casas de luxo.
O custo total das actividades a realizar em torno do F2004 está assim previsto em 2 mil milhões de Euros. Destas despesas, apenas 319 milhões de Euros se destinam ao conteúdo real do fórum em si; os outros 1,740 milhões destinam-se aos novos projectos de remodelação urbana. O projecto é assim acusado de favorecer os grupos interessados no desenvolvimento imobiliário da área e as grandes empresas que aí adquiriram largas parcelas de terreno, sendo o F2004 nada mais que uma propagandeada “face cultural”.

Por todas estas razões, alguns nomes notáveis como Noam Chomsky e Naomi Klein recusaram o convite para participar. No entanto, o fórum confirmou a presença de nomes sonantes como Mikhail Gorbachev, Adolfo Peréz Esquivel, José Saramago, Susan Sontag, Rita Levi-Montalcini, a jornalista Susan George, o editor do Le Monde Diplomatique, Ignacio Ramonet, o activista Arhunditi Roy entre muitos políticos, dirigentes de associações, escritores e jornalistas. Várias centenas de organizações não governamentais também aderiram ao evento e as actividades reveladas pelo site oficial parecem demonstrar o construtivo potencial do evento mais ambicioso do ano.

Enfim, duas faces para um fórum em que a globalização se apresenta sobre o manto colorido da publicidade. A fazer lembrar as palavras de Mariel Hemingway para Woody Allen em Manhattan: “Nem toda a gente é corrompida. Às vezes tens de ter alguma fé nas pessoas”.

Fontes:

Site Oficial do Fórum Barcelona 2004;

Descrição da intervenção urbanística levada a cabo no âmbito do Forum 2004 Barcelona no site da ACTUrban (Agrupació Catalana de Tècnics Urbanistes);

Artigo “Want to Put the World to Rights? Visit Barcelona” por Estelle Shirbon (Reuters);

Artigo “Forum Barcelona 2004: Peace or Profit?” por Nicholas Mead;

Artigo “Waiting For The Rain” por Stefano Portelli.

|feira|do|livro|

Sexta-feira

Arranca hoje a Feira do Livro de Lisboa. Aberta durante duas semanas, é a oportunidade para comprar aquele livro de que anda à procura, ir simplesmente à descoberta ou então completar a velha colecção de BD que tem perdida lá no sótão...

FEIRA DO LIVRO DE LISBOA
21 de Maio a 6 de Junho de 2004.

A 74ª Feira do Livro de Lisboa realizar-se-á de 21 de Maio a 6 de Junho, no Parque Eduardo VII.

Abertura:
Segunda a Sexta às 16:00 horas; Sábados e Domingos às 15:00 horas.
No dia 26 de Maio e no dia 1 de Junho (Dia Mundial da Criança) às 10:00 horas.

Encerramento:
Domingo a Quinta-feira às 23:00 horas; Sextas-feiras, Sábados e no último dia da Feira às 24:00 horas.

|tektonica|2004|

Quarta-feira



TEKTONICA 2004
19 a 23 de Maio de 2004.

Começa hoje na Feira Internacional de Lisboa (FIL) a TEKTONICA 2004 – Feira Internacional de Construção e Obras Públicas.

Tektonica é a maior feira de construção civil e obras públicas realizada em Portugal que contempla produtos para toda a fileira da construção desde as infra estruturas até aos acabamentos.

É composta por três salões, cada um deles perfeitamente sectorizado por famílias de produtos por forma a facilitar a visita à feira. Assim temos:
- Simac – Salão Internacional de Materiais, Máquinas e Equipamentos para a Construção;
- Siror – Salão Internacional das Pedras Naturais;
- SK – Salão Internacional de Pavimentos e Revestimentos Cerâmicos. Espaço Cozinha e Banho.

A Tektonica está aberta todos os dias das 10H00 às 20H00 para Profissionais. O público em geral só poderá visitar a feira no fim-de-semana no mesmo horário

|do|japão|

Terça-feira

Vá pelos seus dedos neste site interactivo com muito design para ver, em Intentionallies.

|os|blogs|não|morrem|

Sábado

Os blogs não morrem. São abandonados como um caderno que se deixa na areia de uma praia para que alguém o descubra. Era bom que os blogs pudessem passar de mão em mão como uma herança secreta, que outros depois de nós pudessem sublinhar e onde pudessem escrever os seus próprios pensamentos e os seus mistérios.

Um blog faz-se como um caminho de pé posto. No princípio não é sequer uma vereda e criamos, com os próprios passos, o percurso que há-de ser mais firme. Depois, a pouco e pouco, com as nossas passadas, o trilho começa a ser visível e a revelar-se, e passado algum tempo começamos a ter alguém que vem connosco. Aí, o trajecto deixa de ser nosso apenas, e passa a ser caminho onde outros descobrem os seus próprios pontos de partida ou de chegada.

Os blogs abandonados desaparecem como um caderno que se deixa na areia de uma praia, e que o vento vai cobrindo a pouco e pouco...

|forum|barcelona|2004|

Sexta-feira



FORUM BARCELONA 2004
9 de Maio a 26 de Setembro de 2004.

O Forum Barcelona 2004 é um espaço novo e criativo destinado à reflexão sobre os principais conflitos sociais e culturais que a humanidade enfrenta neste início do século 21. O Forum é definido por três grandes temas: diversidade cultural, desenvolvimento sustentável e condições para a paz.

O programa completo de actividades pode ser descarregado em formato PDF aqui: Programa do Forum Barcelona em inglês (4.26Mb).

|em|esquisso|

Quarta-feira

A Barriga De Um Arquitecto volta ao estirador, estando assim o blog em pleno projecto de alterações. Espera-se uma remodelação geral muito em breve. Entretanto, e uma vez que vai ser accionado o novo sistema de comentários, o anterior encontra-se desactivado. Como forma de compensar os leitores/comentadores deste blog, os comentários escritos até aqui serão anexados aos respectivos textos durante os próximos dias. Enquanto A Barriga se passeia neste modo "stand by", os leitores que desejarem podem continuar a interagir (e reclamar) via email. Obrigado pela paciência e, como nas obras, prometemos ser breves.

|a|minha|casinha|

Sexta-feira

Casas pré-fabricadas:
Loftcube / Quik House / Glide House / Modular Dwellings / Royal Q / weeHouse



Sofia escreveu:
gosto de te vir visitar... e dás boas sugestões de links ;)
email: sopontocom@clix.pt
05.07.04 - 6:02 pm

Daniel de Castro escreveu:
recomendo www.prefab.com para uma lista exhaustiva de referencias
email: dcastro@telefonica.net
05.09.04 - 12:25 am

Silva escreveu:
Estou confusa! O esquerdo passou a ser o direito? O direito passou a ser o esquerdo? Mas continua tudo na mesma... devia ter trazido os óculos!
homepage: http://avisodechamadaemespera.blogspot.com/
05.11.04 - 4:03 pm

Eu escrevi:
Neste blog as mudanças fazem-se devagarinho... Uma barriga não se modifica da noite para o dia.
05.11.04 - 4:13 pm

Silva escreveu:
Sim, eu sei que aqui a barriga vai mudando de tamanho, conforme a vontade, umas vezes está de dieta, outras vezes de barriguita cheia; mas hoje conseguiu-me baralhar a vista,deixei de ver o umbigo ;)
homepage: http://avisodechamadaemespera.blogspot.com/
05.11.04 - 5:17 pm

António escreveu:
se tiveres tantas duvidas em materia arquitectonica como na construçao do blog, tamos mal , tamos tamos...
05.11.04 - 9:51 pm

|alcântara|rio|

Quarta-feira

A propósito de expressões como “os incaracterísticos oito pisos de altura” que já li por aí, fica aqui um exemplo acertado. Passe a publicidade para o excelente arquitecto Frederico Valsassina e para uma das melhores peças de arquitectura da capital, o recente projecto Alcântara-Rio.

[via Frederico Valsassina Arquitectos]
ALCÂNTARA RIO
ANTIGA FÁBRICA UNIÃO
O espaço sobre o qual incide a presente proposta de intervenção assume características que lhe conferem uma grande especificidade: imediatamente, de carácter topológico, pela delimitação precisa de uma área fortemente contida (Avª. de Ceuta), definida por um entorno constituído por peças de volumetria marcante, em segunda análise, de carácter tipológico e imagético, com possibilidade de relacionamento visual com o exterior, com uma simetria muito marcada e onde as faces verticais que contêm o polígono de implantação do quarteirão são homogéneas, em termos formais, de linguagem arquitectónica, de cromatismo; por último, de natureza lúdica, pela circunstância de se tratar, na sua globalidade, de um espaço integrado com o Rio.

|velho|do|restelo|

Quarta-feira

As cidades mudam como muda a sociedade. Ao longo do tempo a introdução de diferentes valores, capacidades técnicas, ou simplesmente a necessidade de responder a uma carência urgente vão promovendo transformações mais ou menos profundas. Para nós, europeus, a transformação mais importante que se verificou na visão da cidade (enquanto ideia da nossa cultura) foi a introdução de uma dimensão histórica e de um elemento de crescimento. Disse-o Leonardo Benevolo, afirmando que o problema que se coloca hoje às cidades históricas europeias consiste no casamento entre a sua preservação e a sua expansão, e nas formas de conjugar o antigo com o novo e assim dar lugar à variedade. Se os modelos de cidade mudaram ao longo dos tempos, tem permanecido a procura de um objectivo de manutenção da integridade da cidade, introduzindo os conceitos de historicidade e individualidade nos modelos de planeamento.
A doutrina de Leonardo Benevolo pode ser decifrada em palavras simples: temos de fazer uso da experiência passada. Temos de basear o desenvolvimento de uma cidade em torno da sua história, preservando e apreciando as suas referências intrínsecas que guiaram gerações e providenciaram a infra-estrutura básica que chegou aos nossos dias. Isto não significa que devemos ficar presos ao passado, reféns de uma certa ideia de história, que nunca corresponderá à própria história nem poderá servir de base a uma nova realidade contemporânea. Mas significa certamente que a introdução de novos elementos transformadores da cidade no seu todo deve ser ponderada e corresponder a uma real transformação da cultura e da bases em que ela assenta.
As reservas que se levantam ao apelo à construção em altura nas zonas da margem do Tejo tem que ver, acima de tudo, com os motivos dessas iniciativas. Terão os urbanistas ou os arquitectos da cidade descoberto a necessidade de introduzir uma nova imagem de cidade, terão os Lisboetas despertado para o desejo de se reverem numa cidade que plasme uma nova realidade social, política ou económica, de que a construção em altura seria o reflexo? Haverá uma pulsão económica fulgurante que justifique hoje, no actual cenário económico português, a edificação de arranha-céus empresariais como historicamente se justificou em Hong Kong ou nas cidades americanas? Reconheçam-se os promotores da construção em altura em Lisboa e perceba-se que é uma discussão promovida, acima de tudo, pelo sector imobiliário. Fica a pergunta se será o imobiliário, enquanto valor cultural, razão que justifique uma transformação da tipologia da cidade ribeirinha que chegou aos nossos dias através de muitos séculos de história?

|lisboa|fora|de|moda|

Terça-feira

Não, eu não acho nada louvável a intenção de Santana Lopes submeter a um referendo a aprovação da construção de torres na zona ribeirinha de Lisboa.
O populismo tem esta qualidade de se apresentar como uma coisa perfeitamente legítima. Ora o que repugna é esta fachada de honestidade de Santana Lopes, que confessou estar “dividido” entre uma imagem tradicional de Lisboa, e outra de modernidade marcada pela construção em altura. Mas afinal, que ideia tem Santana Lopes para a cidade que se propôs governar?
Talvez eu seja um conservador mas ainda tenho para mim uma ideia de Lisboa como a cidade onde se misturam as referências da cultura mediterrânica com o atlântico. Uma cidade que se desenvolve pela orografia natural das colinas, em que os edifícios se aninham nos vales e nas margens, criando aqui e ali jardins, pátios, miradouros onde ainda se pode ler o tecido da geografia. Uma característica que faz lembrar um pouco as cidades do mediterrâneo.
É uma cidade que entretanto esqueceu o rio durante longas décadas e que só desde os tempos da Expo98 os lisboetas começaram a redescobrir, com a devolução ao domínio público de extensas áreas degradadas do Porto de Lisboa. Ainda que constrangida e pressionada, Lisboa mantém-se reconhecível, com leitura pelo rio.
Haverá neste diálogo lugar para torres de vinte, trinta andares junto à beira rio. Eu gosto de Hong Kong, mas em Hong Kong, não em Lisboa. Não me encanta esta ideia de cidades com assinatura, as Manhattans de Cacilhas ou torres de cem metros no skyline lisboeta. Talvez devêssemos ouvir o Gregotti a falar um pouco no “orgulho da modéstia”. Talvez devêssemos voltar a perceber que a arquitectura também nasce do sítio, de compreender o lugar. O tempo da cidade não é o do devaneio de um homem só, a cidade perdura por séculos. A questão das torres na zona ribeirinha de Lisboa é importante porque não se trata apenas da construção de objectos arquitectónicos mais ou menos relevantes, porventura geniais. Não estamos a falar do objecto em si, como se falássemos de um Guggenheim de Bilbao. A construção de torres, a passar, vai mexer com a própria tipologia da cidade e da imagem do seu todo. Ou alguém duvida que, aberto o precedente, não virão outros logo a seguir?



João RM Matos escreveu:
Creio que a questão central é saber:onde se constroem torres,porque elas vão aparecer quer queiramos ao não.Na minha opinião não nas margens.pelo menos na norte,já a sul não veeria com maus olhos(vide terrenos margueira,quimigal no barreiro e aeródromo do montijo).Um dos dramas de lx deve-se ao facto de ter um aeroporto no centro da cidade que não deixa que se construma as torres onde elas são solicitadas,onde a pressão urbana é maior,as avenidas novas e concretamente o eixo que vai do marquês até ao campo grande.É aqui que se situa o eixo central metropolitano,onde estão as sedes das empresas ,os ministérios,o chamado terciário superior e que devia abandonar a margem rivbeirinha para uma maior fruição da população .
email: jrmmatos@yahoo.com
05.04.04 - 10:20 pm

João RM Matos escreveu:
Porque o plano estratégico de lx,já conmtemplava a saída de algum terciário da margem ribeirinha,conservando-se apenas três praças simbólica do poder.Em belém a presidência da républica,no terreiro do paço a presidência do conselho de ministro e na margem oreigem oriental,mais concretamente no pavilhão de portugal o ministério dos negócis estrangeiros ou outro,tanto faz.Libertando a margem para essencialmente o porto de lisboa e para a fruição dos espaços pelo público.
email: jrmmatos@yahoo.com
05.04.04 - 10:26 pm

António escreveu :
NAO CONCORDO
05.06.04 - 12:40 pm

João RM Matos escreveu:
Não concorda com o quê? Que visões tem de lx?
email: jrmmatos@yahoo.com
05.06.04 - 10:22 pm

CC escreveu:
Joao RM Matos: Independentemente das especificidades do projecto, parece-me idiota assumir que as torres "vao aparecer quer queriamos quer nao". Porque? Sao uma inevitabilidade arquitectonica ou teleologica? Ha muitas cidades que nao tem torres nenhumas (muito menos em zonas historicas) e nao perdem nada por isso. O centro da Europa esta cheio destes exemplos. A "pressao urbana" a que se refere nao seria aliviada pela revitalizacao de todas as zonas mortas do centro de Lisboa, onde nao vive ninguem e as casas se limitam a cair lentamente? E a actualizacao do mercado de aluguer, nao teria o mesmo efeito? Em Lisboa, as pessoas passam a vida a comprar casas minusculas em zonas atrozes quando deveria ser relativamente facil alugarem casas ate maiores no centro. Sobretudo no que se refere a jovens casais e familias. A "inevitabilidade" das torres advem de um problema que nao e arquitectonico nem urbanistico mas sociologico e politico.
05.07.04 - 9:39 am

João RM Matos escreveu:
Obrigado pela sua resposta,concordo com ela e só lamento que isso que diz,não aconteça em Lisboa.Já agora gostaria de lhe perguntar:o que acha de alguns estudos que aparecem na comunicação social dizendo que 46% da populaçao portuguesa viverá na região de lisboa e ao mesmo tempo também se apresenta a diminuição da população.O que se passa?Um fenómeno muito estranho pois se populção vai diminuir tem de ser em algum lado,será que portugal está condenado a transformar-se na famosa frase "lisboa e o resto é paisagem".
email: jrmmatos@yahoo.com
05.07.04 - 10:18 pm

João RM Matos escreveu:
Também gostava de acrescentar que gosto de torres,mas no sítio certo.Se calhasr tem razão,só mesmo Nova york ou hong kong...Que pena talvez este meu desejo de trorres seja um pouco terceiro- mundista ou pior novo-riquismo.Gostei do texto do "regresso ao subúrbio" ainda não respondo porque o texto que escrevi era enorme,portanto não foi possível de envia,espero que não se importe que o envie paras o seu e-mail.assim sabe bem interagir com este blog,obrigado.
email: jrmmatos@yahoo.com
05.07.04 - 10:25 pm

CC escreveu:
Joao RM Matos: os estudos q refere tem uma comprovacao empirica de cada vez que quiser pegar no carro e conduzir em qualquer direccao a saida de Lx por duas horas. Na Galiza, nas "aldeias pequenas e despovoadas" vivem oitenta pessoas que dividem tractores e gado; na Beira Beixa uma "aldeia pequena e despovoada" tem oito casas, ao todo nao mais de 12 habitantes, e nenhum animal maior do que uma galinha ou um coelho. Falo de casos especificos, mas parece-me que a generalizacao nao andara muito longe disto... O pais esta a ficar deserto e nao estao a ser criadas condicoes para se usufruir da potencial qualidade de vida do interior, o que cedo ou tarde vai revelar-se dramatico. De uma volta pelo interior da Franca ou pela Holanda e veja onde esta a agricultura que em Portugal, benza-a Deus, nunca era "rentavel"...
05.09.04 - 8:41 pm

Alexandre Monteiro escreveu:
espantou-me. nunca pensei que pensássemos o mesmo sobre este assunto.
email: arqueologia@portugalmail.pt
homepage: http://alexandre-monteiro.blogspot.com/
05.10.04 - 7:44 pm