Inside a Creative Mind: Gonçalo Byrne e ARX Portugal



Já estão disponíveis para ver na internet as conferências de Gonçalo Byrne e de José e Nuno Mateus (ARX Portugal), promovidas no âmbito do ciclo Inside a Creative Mind da Fundação Calouste Gulbenkian. Os interessados podem também ver o registo da sessão de abertura que contou com a participação de Álvaro Siza Vieira.

As próximas sessões contam com as presenças de Francisco e Manuel Aires Mateus (28 de Abril), João Luís Carrilho da Graça (12 de Maio), Inês Lobo (19 de Maio) e Eduardo Souto de Moura (2 de Junho), tendo lugar no Auditório 2 da Fundação, sempre às 18h30. A exposição estará patente até ao dia 6 de Junho (encerra às terças-feiras).

Cinegirasol: Os Azeitonas + Nuno Markl







É uma era de multiplexes, streaming, DVD e Blu-ray. Viajando de terra em terra, António Feliciano, o homem do Cinegirasol, tenta manter viva a magia do cinema ambulante, projectando épicas aventuras e arrebatadores romances num lençol esticado nas praças centrais das vilas...

Chama-se Cinegirasol e é o mais recente lançamento da banda portuense Os Azeitonas. O videoclipe tem argumento de Nuno Markl, com realização e animação de Bruno Caetano e Rui Telmo Romão, secundados por toda a equipa do Col.A – Colectivo de Animação.

N’A Cave do Markl o humorista conta a história verídica por detrás da música. As desventuras de um senhor chamado António Feliciano, apaixonado pela sétima arte, que vai na sua carrinha percorrendo de aldeia em aldeia, levando consigo o seu cinema ambulante. Eis o Cinegirasol que ilumina praças e leva magia às noites de Verão, em especial nas zonas de Odemira e Vila Nova de Milfontes.

A juntar-se ao registo fotográfico de todo o trabalho que esteve por detrás da construção do teledisco, que Nuno Markl partilha no seu blogue, vale também a pena ver o Making of disponibilizado pelo grupo de autores deste belo projecto de animação. Fica o vídeo, a não perder, para ver depois do salto.

Está um senhor esquisito a sair de uma banheira na TV



Sometimes it snows in April.
Sometimes I feel so bad, so bad.
Sometimes I wish that life was never ending,
But all good things, they say, never last...
And love, it isn't love until it's past.

— Prince, Sometimes It Snows In April (1986).

A primeira vez que vi Prince foi em 1984. Para um pré-adolescente branco dos subúrbios, fã dos Wham!, a imagem de um afro-americano despido, de postura meio andrógina, a sair de uma banheira na televisão era, francamente, demais. A minha imaturidade musical estava longe de poder abarcar o estranho experimentalismo de When Doves Cry e, de resto, o meu inusitado conservadorismo juvenil tornava-me incapaz de aceitar a estética ainda mais transgressora do seu videclipe.

Foram precisos vários anos para que fosse capaz de descobrir a grandeza de Prince Rogers Nelson. Já adolescência adentro, Purple Rain fazia-me compreender que a cultura popular também podia almejar à grandeza da mais erudita das artes – pois que ali se conjugava toda a pujança sinfónica da Pop rock, voando alto ao som de um dos mais orquestrais solos de guitarra eléctrica da história da música.

Foi, a par com David Bowie, um daqueles artistas que nos fez ver que podemos ser e viver desalinhados de todas as convenções. De Minneapolis para o mundo, reclamou o perigo como elemento fundamental da criação musical, desafiando o conservadorismo e o preconceito, na música como na vida. Uma verdadeira Estrela do Rock, compositor genial, autor prolífero, guitarrista brutal, orgulhoso portador da sua herança racial, um maravilhoso weirdo que nunca aderiu a conformidades de género ou sucumbiu a concessões de linguagem.

Hoje a chuva é púrpura e até as pombas choram. Mas a vida é apenas uma festa, e as festas não foram feitas para durar…

Dejected lovers

Zaha Hadid é de facto uma “mulher do seu tempo”, como alguém dizia, e na sua obra podemos ler as marcas e, sobretudo, as ilusões que animaram esse tempo que hoje tanto pesa sobre nós.

— Pedro Levi Bismarck, Duas ou três coisas que se podem dizer sobre ela (Zaha Hadid).

A reflexão (curta mas difícil) que partilhei no dia da morte de Zaha Hadid tomava como ponto de partida a influência que o seu trabalho teve na formação dos arquitectos da nossa geração. O ensaio do Lebbeus Woods, escrito em 2008, servia de janela para aquele mundo aberto pelos seus desenhos, em particular no período entre as décadas de oitenta e noventa.

A referência a Lebbeus Woods não era inocente. Ele, como poucos, foi capaz de apreciar as qualidades indiscutíveis da Zaha Hadid sem abdicar de ter sobre o seu percurso um olhar crítico. Aquele mesmo texto (Protoarchitecture: Analogue and Digital Hybrids) terminava exprimindo perplexidade e angústia sobre o trajecto entre uma estética fragmentária, pluralista e democrática, e uma arquitectura de grandes gestos, elegante, eficaz, mas também inerentemente autocrática.

Fragmentation is inherently democratic, regardless of how dominated at any moment by one style or another—that, after all, remains a measure of choice. Big gestures, however elegant or effective they may be, are inherently autocratic. Here we stand at the precipitous divide between art and politics, which is exactly the domain of architecture in any age. It is the edge on which the drawings and projects of Zaha Hadid are, at this moment, delicately poised.

— Lebbeus Woods, Zaha Hadid’s Drawings 3 (Protoarchitecture: Analogue and Digital Hybrids).

Lebbeus Woods viria a abordar a obra de Zaha Hadid diversas vezes, acentuando esse olhar crítico e crescentemente divergente – sem nunca pôr em causa a enorme admiração que tinha por ela. Em Zaha’s Way, escrito em 2011, refere explicitamente o perigo do abandono daquela arquitectura por um compromisso com a era da incerteza da condição humana vivida no presente.

Aware of the history of the past hundred years and the turbulent character of the present, such an attitude can only seem arrogant and self-indulgent. This appraisal is not simply about images, but about buildings, even masterpieces of architecture regarded as an extension of an architectural history of masterpieces, that are utterly oblivious to the uncertain and conflicted human condition of today, which is unprecedented in history.

— Lebbeus Woods, Zaha’s Way.

Um ano depois Woods voltava a criticar o trabalho de Zaha Hadid, dedicando-lhe “uma espécie de carta de amor”: «Don’t you love me anymore?»

I feel abandoned and bereft because one the most gifted architects of my time has been reduced to wrapping such conventional programs of use in merely expressionistic forms, without letting a single ray of her genius illuminate the human condition. Am I being pretentious and overly demanding? Of course. But that’s the way disappointed lovers behave. Exaggerated emotions. Absurd demands. Anger that transgresses all reason. She has let me down, and what makes it worse is that she apparently couldn’t care less.

— Lebbeus Woods, Zaha’s Aquatic Center.

O texto do Pedro Bismarck é muito interessante e mergulha exactamente nessa perplexidade histórica, com que hoje tanto nos confrontamos, e que eu partilho em absoluto – uma perplexidade que está no cerne do conflito que marca a nossa disciplina neste início de século e a que procurei fazer referência numa reflexão anterior – ler The great architectural divide. Tratava-se de questionar o modo como o “parametricismo”, entranhado numa retórica “liberal de mercado”, parece correr o risco de se tornar rapidamente uma arquitectura do passado, mesmo nas suas manifestações vindouras.

Certo é que, independentemente da divergência que possamos ter com as obras de Zaha Hadid, ela foi indiscutivelmente “uma mulher do nosso tempo” e é, no que à arquitectura diz respeito, a mulher do nosso tempo. Não será possível fazer a história crítica da arquitectura deste período histórico sem que Zaha Hadid ocupe, para o bem e para o mal, nas suas qualidades e nas perplexidades que nos invoca, um lugar central.

Mas talvez Lebbeus Woods o tenha identificado com vários anos de avanço. É que, perante o percurso (irremediavelmente inacabado) da obra de Zaha Hadid, quedamo-nos todos como “amantes entristecidos”.

What is urgently needed now is the very antithesis of utopian purity: masterpieces of imperfection.

— Lebbeus Woods, Zaha’s Way.


Image credits: Zaha Hadid, The World (89 degrees), 1983.

Lá em cima




Duas imagens que marcaram a semana científica que passou. Na primeira, uma vista do Cometa 67P/C-G captada no dia 27 de Março pela nave Rosetta, à distância de 329 quilómetros do seu núcleo, brilhando à contra-luz no alinhamento perfeito com o Sol. Na segunda imagem, o veículo da NASA Opportunity, cuja missão em Marte dura há mais de 4 mil dias, regista a formação de um remoinho de vento na superfície do planeta vermelho.