Quinta-feira
A primeira iniciativa de Cidade Sem Carros (In Town Without My Car) ocorreu em França em 1998. O objectivo do evento era fechar parte das cidades ao trânsito automóvel e demonstrar que outras formas de mobilidade são possíveis. No ano 2000, a Comissão Europeia para o Ambiente decidiu promover a Cidade Sem Carros como uma iniciativa europeia.
Em 2002, a campanha para o dia sem carros transformou-se numa inteira semana de actividades dedicadas à Mobilidade Sustentável, um conceito que tem vindo a ganhar o interesse dos cidadãos europeus que estão cada vez mais sensibilizados para com os problemas ambientais.
O tema da Mobilidade Sustentável abrange as mais diversas áreas da nossa vida. Na verdade, os efeitos da mobilidade sentem-se a muitos níveis: da economia ao planeamento urbano, do ambiente à saúde, da educação aos hábitos culturais e sociais.
A crescente consciencialização dos cidadãos para com a necessidade de implementar formas de gestão sustentáveis e abrangentes ao problema dos transportes esteve na origem da realização do Livro Branco para os Transportes (The Transport White Paper – European transport policy for 2010: time to decide), adoptado pela Comissão Europeia a 12 de Setembro de 2001. Este documento procura apresentar um retrato realista da presente situação europeia e fornecer um plano de acção compreendendo medidas a tomar até 2010.
O ETP2010 começa por apontar como principal problema o crescimento desigual dos diversos modos de transporte. Estas desigualdades resultam das diferentes capacidades de adaptação desses modos às necessidades da economia moderna, mas junta-se a este o facto do preço dos transportes não reflectir todos os seus reais custos externos. Acresce ainda que algumas regulações sociais e de segurança não terão sido completamente respeitadas, notavelmente no que diz respeito ao transporte automóvel. Como consequência, o transporte rodoviário abrange hoje ao nível europeu 44% do mercado de transporte de mercadorias e 79% do mercado de transporte de passageiros. Os efeitos desta realidade são, compreensivelmente, a congestão das vias principais e das áreas urbanas e os efeitos da degradação do ambiente e saúde pública, para além do número elevado de acidentes na estrada e demais implicações humanas e financeiras.
Este é um tema fascinante e, como se vê, extremamente complexo. Os transportes urbanos estão hoje – e constantemente – sujeitos ao conflito entre a procura de mais mobilidade, por um lado, e as exigências de redução da congestão de tráfego e dos custos sociais que geram, por outro. Deste modo, a redução do problema no circuito mediático a um mero combate ao automóvel é, em si mesmo, redutora e perniciosa. Por outro lado, a mera veiculação de realidades de outros países europeus que não são minimamente conciliáveis com algumas das realidades nacionais (como a proclamação do ideal da bicicleta como meio de transporte alternativo na deslocação casa-trabalho), não é benéfica a transmitir o sentido de realismo fundamental para que as iniciativas a tomar se revistam de credibilidade perante o cidadão comum. Especialmente numa questão em que o sucesso depende, em grande parte, da adesão desse mesmo cidadão para com uma causa que o pode obrigar a alterar os seus hábitos e modos de vida.
O problema do automóvel é, assim, um caso particularmente importante e sensível. A percepção de dependência do automóvel que sentem os cidadãos faz com que estes não se sintam minimamente sensibilizados para com o dia da Cidade Sem Carros, não estando igualmente despertos para a divulgação dos objectivos da Mobilidade Sustentável.
É por isso fundamental aprender com a experiência europeia nesta matéria. São os nossos parceiros europeus que começam já a reflectir sobre novas preocupações, nomeadamente a necessidade de resolver o problema do automóvel dentro do sistema de transportes urbanos. Por outras palavras, isto significa que não basta eliminar o automóvel quando não existem estruturas complementares de transporte. Pelo contrário, só criando alternativas viáveis e plenamente funcionais de transporte urbano (boas redes de circulação pedonal, circuitos de bicicleta praticáveis, interfaces de ligação carro/transporte público, sistemas de transporte público eficazes e ecológicos, eliminação de barreiras arquitectónicas, entre outras iniciativas – e finalmente uma boa integração de todas elas) se encontrará a aceitação dos cidadãos para a criação de restrições ao automóvel.
Por outro lado não basta – como dita a experiência desses países – criar um bom sistema, é igualmente necessário consciencializar os cidadãos a adoptá-lo. Assim, o sucesso do desafio da mobilidade sustentável depende da capacidade de fazer o marketing positivo e educar as pessoas a optar por novos hábitos, na certeza de que o abandono do automóvel não seja um abandono da qualidade de vida, mas precisamente o contrário.
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Viva,
ResponderEliminarExcelente texto.Realmente é essa a questão: quanto é que cada um de nós está disposto a recusar e imitar os padrões mais "modernos" e "individualistas" da sociedade em que vivemos? Ma s há mais: E o dar exemplo? Quantas vezes vemos os autarcas nos transportes públicos? E as localidades isoladas do mapa? E os transportes escolares?
Um abraço amigo