Quem chora pelas mulheres de Damasco


Imagem: Talal Moualla.

O que se passa no Afeganistão é uma tragédia. Uma tragédia que é o corolário de vinte anos de guerra em que morreram 241 mil pessoas, das quais 71 mil eram civis.

Como denuncia o projeto Costs of War do Watson Institute, no Afeganistão os Estados Unidos gastaram mais de 2 biliões (milhões de milhões) de dólares de um total de 6,4 biliões dispendidos pelos EUA no Médio Oriente desde o 11 de Setembro.

Se esta verba astronómica é suportada pelos contribuintes norte americanos (presentes e futuros) alguém a ganhou. Tal como os afegãos, os cidadãos norte americanos também são espoliados destas guerras. Os seus vencedores são os poderosos agentes económicos que vivem da guerra interminável e dela se alimentam.

Sob qualquer análise racional estas guerras são insustentáveis e indefensáveis. Resta assim em sua defesa o apelo à emoção, de preferência com recurso a técnicas de chantagem emocional: o medo, a culpa, a humilhação. O método é bem conhecido e sabe-se que funciona. Repetir a mensagem de forma contínua, com cada vez maior intensidade, até que a resistência cesse. Até que a aceitação se torne o caminho do menor esforço. É assim que as rodas dentadas da propaganda manipulam a população, até que esta não só aceite mas defenda aquilo que é contrário aos seus próprios interesses.

Acharemos mesmo que os interesses que se alimentam da guerra – o "complexo industrial-militar", como o definiu Eisenhower no seu último discurso – e que devoram 700 mil milhões de dólares por ano, não têm influência sobre aquilo que vemos na comunicação social? Também não aprendemos nada com a História? A Operação Mockingbird nunca existiu?



O que se passa no Afeganistão é uma tragédia.

Mas porque choram pelas mulheres de Cabul e não choram pelas mulheres de Damasco?

Mulheres que vivem há uma década debaixo da sombra de uma guerra em que o ocidente fez seus proxies (por intermédio da Arábia Saudita) "rebeldes" jihadistas com ligações à Al Qaeda (Al-Nusra Front, Jaysh al-Islam, Hay'at Tahrir al-Sham, etc...).

O que aconteceria a estas mulheres, maioritariamente muçulmanas mas também cristãs (porque na nação secular da Síria existe uma comunidade cristã) se a Operação Timber Sycamore delineada pela CIA tivesse tido sucesso e os fundamentalistas ocupassem Damasco?

Sabemos o que aconteceria, porque aconteceu às mulheres de Idlib, de Alepo e de outras regiões durante a ocupação "rebelde".

Chorámos pelas mulheres de Alepo quando estes radicais ocuparam a cidade? Chorámos com os relatos (que não vimos na comunicação social mainstream ocidental) de escravidão e de tortura?

De que lado estávamos quando as tropas Sírias reconquistaram Alepo? Porque lhe chamámos de massacre, quando, contra idênticos inimigos, vimos em Mossul uma libertação?

Por quem chorámos ontem? Por quem choramos hoje?

Quem escreve a narrativa do mundo?

O que se passa no Afeganistão é uma tragédia. Mas a solução não pode ser colocada nas mãos daqueles que doutrinam os seus povos à ideologia da guerra interminável e com ela lucram.

A guerra é parte do problema. Não é, e não será nunca, a solução.


Sobre este tema recomendo a visualização do documentário Breaking the Silence: Truth and Lies in the War on Terror (2003), dirigido por John Pilger.

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