O urbanismo é tão mais eficaz quanto mais simples são os seus propósitos, propósitos esses que, devido a essa procura da simplicidade, devem ser correctos. E é aqui que a sociologia tem o seu papel: na elaboração de estudos que minimizem a margem de erro das opções urbanísticas. No fundo, deve ser passiva, não activa. Porque para a cidade quero o mesmo que para tudo o resto: que o princípio da liberdade e auto-regulação prevaleça. Ninguém gosta de crescer entre espartilhos.
Complexidade e Contradição: Sometimes it takes simple models to better understand complex behaviour, 2005-07-10.
Ao estudo do comportamento social humano, das suas origens, organização, interacções, chamamos de Sociologia. Não está incorrecta a utilização deste termo pelo Lourenço para definir genericamente aquilo que são as áreas de “não-desenho” do planeamento urbano. A evolução da Sociologia no âmbito das ciências humanas transformou-a num universo abrangente onde cabem aspectos da economia, da estatística, da sondagem qualitativa, da psicologia, da análise histórica.
Interessante é a associação dessa definição ao conceito de espartilho; não sei se intelectual ou formal. Independentemente disto, parece-me que sobressai daqui uma grande confusão: essa(s) Sociologia(s) de que se fala são ciências ou ideologias? As ciências sociais podem produzir formulações interpretativas das realidades observadas mas devem sustentar-se numa monitorização rigorosa e científica dessa realidade; não promulgar conceptualizações ideológicas da mesma. Assim sendo, se traduzem a nossa compreensão possível da verdade, como podem ser espartilhos?
O que escrevo pode traduzir um mal entendido do texto original. Seja como for, sou levado a continuar a frase do Lourenço com ironia - ninguém gosta de crescer entre espartilhos, a não ser que sejam os do arquitecto.
Eu discordo do essencial, que os propósitos do urbanismo devem ser a procura da simplicidade. Pelo contrário, o urbanismo é mesmo a arte da complexidade. É uma questão de “layers”, e urbanismo tem muitas “layers” e grande parte delas não tem que ver com desenho.
A questão, parece-me, não é tanto da incapacidade do urbanismo produzir modelos que traduzam a organicidade incontrolável da cidade. O objecto do problema é o facto do urbanismo ter “know-how”, tem linguagens e, de certo modo, ferramentas (“tools”), que a maioria dos que fazem urbanismo não conhecem ou não sabem para que servem. Os eixos, as estruturas, os espaços abertos. Limites, sectores, densidade, diversidade, conectividade, coesividade, sentido de lugar, referências visuais. O urbanismo faz-se com um tecido de conceitos que muitos não conhecem nem estão despertos a aprender. Esse “know-how” está dramaticamente ausente do nosso ensino académico e poucos o aplicam na sua vida profissional. O resultado é uma coisa que nem sequer se pode chamar urbanismo, uma coisa inane sem conceitos nem conteúdos que corresponde a noventa por cento da nossa realidade urbana.
O urbanismo não serve para “controlar” a cidade, para tornar expectável o resultado das inúmeras interacções finas da vivência humana no tempo. O urbanismo serve para introduzir inteligência no processo, para contrariar o “laissez-faire” que só uma grande boa vontade pode chamar de liberdade e auto-regulação. Quando a auto-regulação está entregue aos bárbaros, eu peço que tragam os romanos de volta. Mas isso, claro está, já é fazer ideologia. E o urbanismo é isso mesmo.
A arte da complexidade
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Daniel, sabia que ias (ou podias) pegar neste texto meu. A verdade é que mal o publiquei percebi que tinha uma série de coisas por explicar e que não era mais do que uma provocação minha. Mal feita, claro está, porque não consegui explicar bem onde queria chegar. Vou tentar fazê-lo quando tiver tempo. Mas o que esteve na base deste texto, em parte, é a sensação de desconforto que tenho ao ver, por vezes, projectos de desenho urbano que assumem um grau de "estrelato" que não compreendo. Por vontade dos seus autores, sim. Não gosto de um urbanismo muito "visível", muito presente, muito "desenhado". Acho que "(o)s eixos, as estruturas, os espaços abertos. Limites, sectores, densidade, diversidade, conectividade, coesividade, sentido de lugar, referências visuais" devem conseguir aparecer como naturais. O que tem acontecido ultimamente é que o desenho urbano está já contaminado pelo "glamour" mediático da arquitectura. Mas se na arquitectura isso ainda é tolerável, no urbanismo é mais grave. Mas concordo com este teu texto. Não quis menosprezar o urbanismo, longe disso.
ResponderEliminarMais uma coisa: repara como aquilo que a fazes referência (e bem) para defender o urbanismo como a "arte da complexidade", são elementos próprios do desenho urbano em si mesmo, tendo pouco a ver com a "sociologia" que eu, de certo modo, atacava no post. E tens toda a razão em relacionar esta "sociologia" com ideologias, acho que era aí que queria chegar. Mas já percebi que tenho aqui material para post. Quando tiver tempo estruturo melhor estas ideias. Um abraço.
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