A paisagem global



O movimento moderno introduziu alterações radicais no nosso modo de pensar e conceber as cidades. Uma dessas mudanças resultou da segregação de funções, a fragmentação de tudo, das actividades ao próprio tempo. Introduziu uma nova base teórica para compreender as funções em arquitectura e urbanismo, e resultou numa ruptura clara com conceitos passados – na relação entre rua e edifícios, entre a rua e a cidade.
Uma das mudanças mais imediatas e palpáveis foi a transformação da terminologia da arquitectura. O urbanismo sofreu as consequências da sectorização e da mecanização. De um ponto de vista académico, a própria estrutura do conhecimento se tornou conceptualizada. Os conceitos e a sua análise são tomados como as próprias realidades que representam. Sistemas complexos são ignorados, em detrimento de grandes medidas utópicas.
Mesmo hoje, os sistemas políticos de planeamento urbano são receptores desta herança moderna. A separação artificial entre urbano e rural, cidade e paisagem. A construção tornou-se no objecto do urbanismo. É um planeamento negativo, restringindo funções e impondo limites, mas incapaz de antecipar a evolução da realidade urbana. Planos urbanos tornam-se pouco mais do que ferramentas de gestão da construção.
Mas a cidade, enquanto realidade, existe no território e não no espaço abstracto. É um território com morfologia, com estruturas aquíferas, com solo, com vegetação, com ar.
A água circula no subsolo da cidade. O ar circula entre as formas da sua topografia e entre as estruturas construídas. O calor concentra-se e é reflectido pela superfície dos edifícios. A vegetação consome calor e retêm água. Retém partículas da atmosfera e incrementa a capacidade de infiltração de água no solo.
A importância dos sistemas naturais na cidade tem uma relação directa com o seu equilíbrio ecológico, enquanto realidade viva em que todos vivemos. O urbano não apaga o natural. Complexidade e pensamento complexo são necessários para compreender a cidade contemporânea como parte desta vasta paisagem global.

Global landscape
Modern movement introduced radical changes to the way we understand and conceive cities. One of those changes resulted from the segregation of functions, the fragmentation of everything, from activities to time itself. It introduced a new theoretical basis to the understanding of functions in architecture and urbanism, and ultimately resulted in a clear rupture from past concepts – in the relation between the street and buildings, between the street and the city.
One of the immediate palpable changes was the transformation of the architectural terminology. Urbanism suffered the consequences of sectorization and mechanization. From an academic standpoint, the very structure of knowledge becomes conceptualized. Concepts and their analysis are taken as the very realities they represent. Complex systems are ignored, overcome by great utopian measures.
Even today, political systems of urban planning are recipients to this modern heritage. The artificial separation between urban and rural, city and landscape. Construction becomes the sole object of design. It’s a negative planning, restricting functions and imposing limits, but unable to anticipate the evolution of the urban reality. Urban plans become nothing more than tools for the management of construction.
But the city, as a reality, exists in the territory and not in abstract space. It is a territory with morphology, with water structures, with soil, with vegetation, with air.
Water circulates in the subsoil of the city. Air flows through the forms of its topography and through structures. Heat concentrates and is reflected by the constructed surface of buildings. Vegetation consumes heat and retains water. It retains particles from the atmosphere and increments the infiltration of water in the soil.
The importance of natural systems in the city has a direct relation with its ecological balance, as the living environment in which we all live. Urban doesn’t erase the natural. Complexity and complex thinking are needed to understand the city of today as a part of this larger, global landscape.


(image via Urban Nature)

4 comentários:

  1. Engraçado Daniel, eu acredito que esta dicotomia explicitada no texto seja exatamente o mais ambiciosos desafio da arquitetura neste novo século.

    Como a arte e a vida caminham de forma pendular, negando o seu antecessor através do tempo, acho que é hora de retomarmos o pensamento de construção orgânica aliando este movimento ao surgimento de uma nova consciência ecológica.

    Se não entendemos mais a moradia como a "máquina de morar" é preciso refletir isso nas nossas cidades e arquiteturas.

    Gostei muito do blog, espero manter contato.

    grande abraço.

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  2. Goncalo Ribeiro Telles fala do conceito da Paisagem Global à mtos anos. Vale a pena ler tb...

    Cumprimentos e parabens pelo blog,

    mc

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  3. Assim como Ribeiro Telles sempre intemporal, mas Manuela Raposo Magalhães e Aurora Carapinha tambem Arquitectas Paisagistas,mas de outra geração, mais recente, tem como conceito a Pasaigem Global. A quem se interesse pelo assunto vale a pena.
    parabens pelo blog continuem.
    c.r.

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  4. Brilhante.
    Pertinente e perenemente actual.
    Portugal tem estes homens extraordinarios.
    A Manuela Raposo Magalhaes sim tem merito. A Aurora tem sede de poder mas tambem, enfim, vai remando, repetindo o Mestre.

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