Joshua Prince-Ramus e a marginalização da arquitectura



A primeira ideia que me ocorre ao ouvir a mais recente conferência do Joshua Prince-Ramus no TED é o quão longe a abordagem que ele nos apresenta está da prática que nos rodeia. É como se ele nos falasse não apenas noutra língua mas de um outro planeta. O drama está em que este tipo de procedimento, não de projectar edifícios mas de pensar os próprios processos de fazer arquitectura, não só é completamente diverso do estabelecido no nosso mundo académico como é algo que esse mundo repudia com total displicência. Basta ler as manifestações recorrentes de crítica a algo que não raras vezes se mistura no saco genérico de uma “arquitectura da imagem”, confundindo coisas bem diversas e descartando correntes arquitectónicas fundadas numa complexa mecânica programática.

Atrevo-me a dizer que as nossas escolas não só produzem alunos que não compreendem estas metodologias como os induzem a opor-se a elas. Diligentemente exortam os arquitectos a fundarem-se na crença de um purismo genético, recusando-se a compreender a complexidade disciplinar em que hoje a arquitectura se processa. Grande blasfémia: que pode haver mais arquitectura numa folha de excel do que num eloquente esquisso seminal. Prince-Ramus fala da necessidade de aprender a manipular contratos, em compreender o valor-tempo do dinheiro, em trabalhar sobre estimativas orçamentais. E fala de uma coisa verdadeiramente lunática: estabelecer bases programáticas e trabalhar conjuntamente com o cliente no sentido de construir uma visão sobre os objectivos de projecto; e só depois iniciar um trabalho de concepção formal.

Estamos no território da negação da arte do desenho. Não há lugar a pequenos gestos formais iniciáticos que conduzam à produção da “obra”. Eis uma arquitectura que assume o desejo de desconhecer um resultado final. Uma arquitectura que se pretende como processo de descoberta sem caminhos fáceis. A rejeição do simplismo.
Atrevo-me a dizer que não há outra forma de fazer arquitectura contemporânea. E sublinhar uma ideia que decorre do que expõe Prince-Ramus: que não há boa arquitectura sem um cliente sólido. Os exemplos de falhanço somam-se em nossa volta em obras bem recentes, públicas e privadas, seja pela presença de um mau promotor como pela sua ausência de participação. Não existe ilusionismo para contornar a necessidade de um processo colaborativo e participado, que comprometa arquitecto e promotor na tomada de decisões – e de boas decisões. O projecto do Wyly Theatre, que já passou aqui no blogue, é apenas um exemplo.

Ver: REX, TED, Joshua Prince-Ramus: Building a theater that remakes itself.

2 comentários:

  1. Eu também concordo. Há falta de gente que queira arriscar, está tudo acomodado ao que já existe, é mais seguro. Boa análise, como sempre e bom sentido crítico.

    ResponderEliminar