Quarta-feira
As cidades mudam como muda a sociedade. Ao longo do tempo a introdução de diferentes valores, capacidades técnicas, ou simplesmente a necessidade de responder a uma carência urgente vão promovendo transformações mais ou menos profundas. Para nós, europeus, a transformação mais importante que se verificou na visão da cidade (enquanto ideia da nossa cultura) foi a introdução de uma dimensão histórica e de um elemento de crescimento. Disse-o Leonardo Benevolo, afirmando que o problema que se coloca hoje às cidades históricas europeias consiste no casamento entre a sua preservação e a sua expansão, e nas formas de conjugar o antigo com o novo e assim dar lugar à variedade. Se os modelos de cidade mudaram ao longo dos tempos, tem permanecido a procura de um objectivo de manutenção da integridade da cidade, introduzindo os conceitos de historicidade e individualidade nos modelos de planeamento.
A doutrina de Leonardo Benevolo pode ser decifrada em palavras simples: temos de fazer uso da experiência passada. Temos de basear o desenvolvimento de uma cidade em torno da sua história, preservando e apreciando as suas referências intrínsecas que guiaram gerações e providenciaram a infra-estrutura básica que chegou aos nossos dias. Isto não significa que devemos ficar presos ao passado, reféns de uma certa ideia de história, que nunca corresponderá à própria história nem poderá servir de base a uma nova realidade contemporânea. Mas significa certamente que a introdução de novos elementos transformadores da cidade no seu todo deve ser ponderada e corresponder a uma real transformação da cultura e da bases em que ela assenta.
As reservas que se levantam ao apelo à construção em altura nas zonas da margem do Tejo tem que ver, acima de tudo, com os motivos dessas iniciativas. Terão os urbanistas ou os arquitectos da cidade descoberto a necessidade de introduzir uma nova imagem de cidade, terão os Lisboetas despertado para o desejo de se reverem numa cidade que plasme uma nova realidade social, política ou económica, de que a construção em altura seria o reflexo? Haverá uma pulsão económica fulgurante que justifique hoje, no actual cenário económico português, a edificação de arranha-céus empresariais como historicamente se justificou em Hong Kong ou nas cidades americanas? Reconheçam-se os promotores da construção em altura em Lisboa e perceba-se que é uma discussão promovida, acima de tudo, pelo sector imobiliário. Fica a pergunta se será o imobiliário, enquanto valor cultural, razão que justifique uma transformação da tipologia da cidade ribeirinha que chegou aos nossos dias através de muitos séculos de história?
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