O princípio do fim da europa



É difícil dizer se o referendo ao projecto da Constituição Europeia é ou não o princípio do fim da União. Os sinais, no entanto, são desencorajadores. Arrasta-se há muito o grande desinteresse público nas questões europeias, que se reflecte nas elevadas abstenções das eleições para o PE. O tema do referendo veio agora trazer novas controvérsias, aumentar hipocrisias e gerar um sentimento de grande desconfiança. Terá chegado ao fim a motivação para continuar?

Será esta uma Europa em busca de coesão social; com participação económica e política; de fácil acesso à educação, igualdade de oportunidades e de saber; que promove a cultura da sustentabilidade; que é sensível aos fenómenos de exclusão? Será esta uma Europa que nos move verdadeiramente e da qual queremos fazer parte?
Como seria bom ver estes temas aprofundados na actual discussão, e mais importante, na forma como esses valores estão actualmente institucionalizados e desenvolvidos na União e em cada um dos seus países. O que é que temos nós verdadeiramente em comum? Esta para mim é a pergunta crucial, porque sem uma identidade partilhada será impossível gerar consenso e legitimidade à volta da construção europeia.

Um dos grandes erros em torno de todo o debate Europeu é a sua centralidade no aspecto político e não no aspecto social. Penso que é aí que se poderiam promover alguns laços comuns entre os seus cidadãos, não do que são mas daquilo que gostariam de vir a ser como um todo. Penso que a Europa tem esse legado cultural que lhe pode permitir construir uma identidade comum de futuro. Acredito que essa experiência partilhada dos cidadãos não tem de implicar a perda de valores locais ou regionais, pelo contrário, deve ser uma adição a estes.
Nessa grande discussão que está por fazer em Portugal, deveríamos reflectir sobre qual o contributo que temos dado enquanto país à construção europeia. Somos um país em perda, com fraca participação cívica e agravadas desigualdades políticas e económicas. Um país onde a sustentabilidade é apenas um slogan, sem estratégias claras em torno dos aspectos mais essenciais para a nossa (sobre)vivência futura. Por isso tenho grande dificuldade em me associar aos subscritores do “não”, porque reconheço em muitas áreas que os bons exemplos vêm da doutrina europeia: no desenvolvimento sustentável, na cidadania participada, na mobilidade, na energia e em muitas outras áreas que se vêem ser tratadas com uma honestidade intelectual muito superior à nossa. Não estou a dizer que a União é perfeita, mas que os seus problemas institucionais não nos deviam fazer afastar da desejabilidade do projecto europeu como um todo.

Sem assumir aqui a posição de que “sou contra o não e tudo o que ele representa”, parece-me muito difícil deixar de ver no “não” uma dramatização conjuntural de desconfianças antigas pela União Europeia. As críticas a uma lógica funcional e institucional orientadora da Europa, em contraste com uma suposta Europa das nações. Sim, a União é um projecto político. Que mal tem isso? Que limitações traz para a nossa liberdade de participação e expressão individual? Não fazemos parte dela?
Os apoiantes do “não” apontam a falta de legitimidade democrática e de participação popular na construção da União. Há certamente aqui uma falha política, mas também há uma responsabilidade grave dos cidadãos que se abstêm e desinteressam por uma Europa que lhes diz respeito e da qual fazem parte. Mais grave ainda em Portugal, este assacar de falta de legitimidade, num país tão atrasado na implementação de processos de cidadania e participação cívica que, pasme-se, vêm da Europa.

No referendo ao projecto da Constituição Europeia, escolho o “sim” não pelas certezas mas pela esperança nas perguntas. Houve um sonho chamado Europa. Devemos-lhe dedicação e entusiasmo. Eu voto “sim” porque acredito que pouco mais nos resta sem ela.

[quero saber mais: Sítio Do Não; O Sítio Do Sim]

6 comentários:

  1. Da Europa só quisemos o dinheiro, porque sempre estivemos de costas voltadas para tudo. Mas desconfio muito de referendos de burocratas.
    Somos demasiado territoriais para ter grandes utopias de europas sem fronteiras, preferimos que venham cá gastar o dinheiro e se vão embora para casa.

    ResponderEliminar
  2. Isso significa que o "Sítio do Também Não" não é merecedor de referência, isto é, que as razões à esquerda do PP (pacheco pereira, mas poderia ser o outro PP) não contam para nada?



    Blog sobre o Tratado da Constituição europeia:

    O Sítio do Também Não

    ResponderEliminar
  3. Daniel,

    Leia as anexos do Tratado, se faz favor, e depois fale connosco sobre as preocupações de coesão social que lá vê defendidas.
    Leia o texto integral...
    Explique-me também por que se substitui o conceito de "serviço publico" por serviço de "interesse publico" confinado, segundo o artigo II-123, à regulação de principios económicos (leia-se, critérios de rentabilidade).

    ResponderEliminar
  4. Nunca tinha ouvido falar do sítio do também não. O meu texto é uma opinião pessoal introdutória sobre a questão, que se o tempo me permitir voltarei a abordar. De qualquer modo, os sítios que referenciei como "quero saber mais" eram pontos de partida para quem desejar procurar outras opiniões e informação adicional. Se interpretam a vossa ausência como uma espécie de sonegação, só tenho a dizer-vos: "disparate"!
    Quanto ao resto, sim, conheço os anexos e escreverei sobre eles. Agradeço o vosso interesse na minha opinião, a maioria dos meus leitores provavelmente já me achará chato que chegue. Quanto ao "depois fale connosco", espero que seja só uma pergunta retórica.

    ResponderEliminar
  5. o texto é interessante, mas coloca a questão da europa em abstracto: o voto é determinado pela Ideia e não pela realidade, a qual é transferida para um lugar fora do mundo. O que conta não são as relações de causa e efeito, mas as relações de meios a fins: todo o meio é justificado pela nobreza do fim. aí, de facto, não resta senão a esperança. por outro lado, e para usar uma metáfora 'arquitectónica', acredita que as casas se constroem começando pelo tecto.
    os 'medos' que destroem a lucidez dos apoiantes do não, serão reais em alguns casos, mas pode dizer-se o mesmo de alguns dos votantes do sim (privilégios dos burocratas políticos, seguramente superiores aos meus). Quando ao fim da UE, esteja descansado, que toda aquela gente não emala a trouxa e ruma a suas casas. Eles arranjarão maneira de não se tornarem redundantes.

    ap

    ResponderEliminar
  6. e ae, daniel, respondendo sua pergunta sobre se sou biólogo evolucionista ou criacionista...bem, como tudo são teorias científicas (ou seja, com evidências), eu decidi juntar essas duas... ou seja, eu creio que haja evolução das espécies, e tudo isto foi ordenado por Deus para que acontecesse... creio que ele planejou tudo para que assim acontecesse. Lendo melhor a bíblia, vc percebe isto... até qdo ele fala sobre as plantas, segue uma ordem de evolução... lá fala que primeiro veio as ervas simples, depois as com semente e depois as com fruto... dê uma olhada nos livros de botânica e faça uma correlação... mas não creio por causa dessas evidências, mas por uma evidência maior, a fé! Um abraço pra ti!! Valeu pela visita!

    ResponderEliminar