Ninguém sabe o que isso é sem o ter vivido. A caminho do terceiro mês o destino traçou que não tinha de ser; e assim se perdeu a nossa pequena promessa no lugar das coisas de que ninguém gosta de falar. Acontece com frequência nestas alturas, é uma coisa normal – disseram-me. Uma coisa normal, que a areia do tempo cobrirá, como algo que não deveria ter sido.
Puro e absoluto, esse mistério. Que se essa vida tivesse sido talvez tudo fosse hoje diferente. Que por mais que mergulhemos nas profundezas deste mundo apenas tocaremos a sua fina superfície. Não, nada é normal na magia de uma vida que começa. Nada é normal no que nos une e desune, no bater do nosso coração, no simples facto de estarmos aqui.
É incómodo escrevê-lo? Não será este o lugar? Talvez. Mas sei que por demasiado tempo silenciei esta perda. Sólido, como carvalho, o ombro firme onde te quis proteger. Apaguei as lágrimas, como quem quebra o mecanismo da dor, que é o mesmo do sentir. Fiz da minha cara uma barragem das tormentas que lá dentro revolveram. E por um instante apenas chorei, quando pensei que por momentos tive um filho, que o destino traçou nunca iria conhecer; a sua face, o seu sorriso, tudo o que poderia ter sido.
Já percorremos um bom caminho juntos, entrelaçámos estas nossas histórias. E algures nesse trilho, no desejo de pintar o quadro perfeito onde tudo pudesse recomeçar, esquecemo-nos de nós. Que o amor é o caminho fino e frágil, como o berço ventre de uma nova vida. Que preciosos são estes momentos, finos dedos que se espraiam ao som de um pequeno coração. E é por isso que hoje não estou mais triste, porque hoje tudo começa e posso escrevê-lo, como o amor por estas coisas que nunca foram, mas serão sempre dentro de nós e estarão connosco, em toda a parte. Amanhã, sentados no topo do mundo soltaremos gargalhadas perguntando porque esperámos tanto. E voltaremos a descer desses lugares distantes para mergulhar nestes mistérios, e hoje apenas isso me faz acreditar, que eu vou chegar contigo, onde só chega quem não tem medo de naufragar.
Eu amo-te.
Sei de cor cada lugar teu
atado em mim, a cada lugar meu
tento entender o rumo que a vida nos faz tomar
tento esquecer a mágoa
guardar só o que é bom de guardar
Pensa em mim protege o que eu te dou
Eu penso em ti e dou-te o que de melhor eu sou
sem ter defesas que me façam falhar
nesse lugar mais dentro
onde só chega quem não tem medo de naufragar
Fica em mim que hoje o tempo dói
como se arrancassem tudo o que já foi
e até o que virá e até o que eu sonhei
diz-me que vais guardar e abraçar
tudo o que eu te dei
Mesmo que a vida mude os nossos sentidos
e o mundo nos leve pra longe de nós
e que um dia o tempo pareça perdido
e tudo se desfaça num gesto só
Eu vou guardar cada lugar teu
ancorado em cada lugar meu
e hoje apenas isso me faz acreditar
que eu vou chegar contigo
onde só chega quem não tem medo de naufragar