Terça-feira
A construção civil sempre foi tida como um bom referencial da actividade económica e do desenvolvimento de um país. No entanto, o mundo da construção de hoje já não é o de há cinquenta anos. Apesar da construção que se faz em Portugal ainda assentar em grande parte em métodos tradicionais desactualizados em relação à realidade internacional, a inserção de materiais e maquinaria de origem estrangeira (com crescente presença da produção vinda de Espanha e outros países europeus) vai transformando de uma forma invisível ao senso comum o papel da construção enquanto factor de produção de riqueza.
Quando uma actividade económica aplica materiais oriundos da produção industrial nacional está a canalizar riqueza para dentro do seu próprio sistema económico. Mas quando essa actividade aplica uma grande percentagem dos custos em materiais e maquinaria de origem estrangeira, está a transformar aquilo que aparentemente pode ser um investimento nacional, num consumo externo. Este facto é tanto mais verdadeiro à medida que as mais importantes empresas portuguesas da construção vão sendo agregadas a grupos económicos internacionais, que se tornam os verdadeiros detentores das grandes empreitadas públicas do país.
Mas se a coexistência com o mercado económico internacional é uma realidade com que nos temos de confrontar, o custo dos erros de planeamento na área da construção é algo que é da responsabilidade única dos portugueses. Décadas de relacionamento promíscuo entre o estado e a construção civil, em que em nome da necessidade de fazer e mostrar obra prevaleceu o vale-tudo ao nível dos gastos e das regras, criaram uma herança pesada que o país terá de suportar no futuro. Veja-se o caso do Programa POLIS. Sem querer enveredar aqui pela via das recentes polémicas em torno do assunto, cujos frutos serão os previsíveis, ou seja, nenhuns, é preciso reconhecer que o POLIS, com muitos méritos na minha opinião, é também o sintoma e o preço a pagar pelos erros do passado na área do urbanismo. Mas o que verdadeiramente preocupa não é o preço do POLIS em si mesmo, que é apesar de tudo a canalização de uma grande fatia de fundos estruturais comunitários para realizar obras em muitos casos notáveis de reconversão urbanística e com impacto reconhecível ao nível da qualidade de vida nas cidades portuguesas. O que preocupa é que, enquanto se paga o POLIS, continuam a cometer-se os mesmos erros de planeamento urbanístico ao nível do fazer cidade nova, por todo o país, erros que nos obrigarão a pagar os POLIS do futuro e que hoje bem podíamos estar a evitar cometer à partida.
É neste panorama de desvantagem cultural que nos caracteriza, que a notícia de mudança de orientação dos fundos comunitários prevista no novo pacote financeiro da União Europeia para 2007/2013 chega como um verdadeiro sinal de esperança. Para além do facto de que Portugal não deverá sofrer cortes significativos no acesso aos fundos estruturais, esses fundos já não serão canalizados para a área da construção de auto-estradas ou equipamentos, que deverão ser realizados à medida das capacidades nacionais, passando agora para o incentivo em políticas de competitividade que fomentem formação e qualificação, a tecnologia e a investigação. Os dinheiros europeus devem agora servir para Portugal melhorar os recursos humanos. (...)A nova situação constitui uma oportunidade para se alterar a cultura de utilização dos fundos estruturais, segundo uma fonte comunitária, a aposta deve ser agora a sociedade de informação e do conhecimento.
Finalmente Portugal vê chegar uma oportunidade de iniciar um verdadeiro investimento em educação e formação profissional, que nos poderá conduzir ao trilho já percorrido por outros países da União Europeia e os levou a um patamar de desenvolvimento invejável. Só é triste que seja a UE e não Portugal a determinar para si essa prioridade. Como sempre, o ignorante nem sequer sabe aquilo de que verdadeiramente precisa. Felizmente, porque somos bons alunos, seguiremos o percurso estabelecido pelo bom professor europeu que, ele sim, aprendeu a lição.
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