Segunda-feira
Fins de Agosto de 1991.
Ficámos no segundo andar de um prédio meio desabitado com uma tasca no rés-de-chão. Algures nas ruas de San Polo, em pleno coração da cidade e fora do percurso dos turistas. Ali conhecemos a Veneza dos venezianos.
Juntavam-se ao fim de tarde na tasca para beber tintos e comer queijo enquanto jogavam jogos de taberna e cantavam trechos de ópera. Parecia o cenário de um filme, mas assim era e aquela cantoria ecoava pelas ruas estreitas e o fino canal, entrando pelas janelas abertas dos vizinhos.
O cheiro! Ah, o cheiro a humidade intensa e o calor quase insuportável de Verão. Mas era fantástico, era estar mesmo ali no meio do suor e da vida real. Os reflexos no tecto, os sons da calçada, uma senhora que regressa das compras, uma conversa incompreensível na mercearia, um rádio no terceiro andar, o gaiato que grita à janela...
Veneza é a cidade cosmopolita parada no tempo, do inevitável Palazzo Grassi e do Museu Guggenheim à beira rio, do mercado de legumes do Rialto e da Praia do Lido com relvado frente ao bungalô.
Regressei a Veneza passados dois anos e fiquei alojado com amigos no Albergue de Juventude da ilha de Giudecca. Com horário para entrar e para sair e cheiro a pés de inter-railers já não me pareceu a cidade do Corto Maltese.
Um dia hei-de voltar em busca da minha Veneza.
[imagem via]
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