Inês Lobo Biblioteca de Angra do Heroísmo







Projecto de Inês Lobo para a nova Biblioteca Pública e Arquivo Regional de Angra do Heroísmo.
Um ponto de partida interessante: desenhar um edifício não pelos seus volumes mas pelos seus vazios. Pensar os espaços gerados para lá da forma, a sua face pública e a ligação aos percursos da malha urbana exterior. Assim nasce uma arquitectura intimamente relacionada com as especificidades da sua própria situação.
O trabalho resulta na composição de dois corpos justapostos, ensaiando-se sobre eles vazamentos internos e espaços externos contíguos. Um jardim a topo e uma praça elevada que lhe é oposta definem dois momentos principais de uma mancha volumétrica coesa, orgânica, que busca o seu sentido no sítio e a ele confere igualmente a sua razão de ser.
Ficam as belas imagens de uma visualização em maquete, aguardando-se com expectativa a sua materialização futura.

Arquitectura: Inês Lobo.

It’s a link party!

Os Bloggies são sempre uma oportunidade para descobrir excelentes blogs de todas as partes do globo. Os vencedores só serão conhecidos a 12 de Março mas não resisti a adicionar, desde já, alguns ao blogroll.

French Toast Girl, a vida contada em tons de aguarela.

Veerle's Blog o diário de uma web designer. Template fantástico.

Subtraction 7.0, outro web designer.

Pearsonified, e mais outro.

Dooce, e ainda, desta feita com belas fotografias. Confesso que sou um totó por um bom template.

Stuck In Customs, um fotoblog espectacular, a par com outra referência que dá pelo nome de Daily Dose Of Imagery.

Digital Photography School, nunca é tarde para aprender.

Apartment Therapy, design de interiores. Ideias para trazer o bling até à vossa casa.

Pingmag, magazine online de design sediado em Tokyo, com um estilo super-profissional.

Drawn, blog colectivo de ilustração e cartooning com um excelente trabalho de divulgação e muitos links da área.

Cute Overload, é bichos!

Boing Boing, o essencial.

Gonçalo Byrne Edifícios da Horta da Porta















Projecto recente de Gonçalo Byrne construído em Évora, numa parcela situada na envolvente próxima ao contorno muralhado do seu centro histórico.
Numa cidade em que as intervenções contemporâneas nem sempre têm obtido os resultados felizes que se esperariam as obras de Byrne têm assegurado uma marca de qualidade. O conjunto edificado da Horta da Porta estabelece uma relação descomplexada com o enquadramento pré-existente, introduzindo uma sequência de espaços em tensão formal com a muralha.
O volume urbano insere-se numa lógica de integração com sentidos visuais e de acesso, estendendo o eixo viário que divide uma área de estacionamento contígua ao aqueduto. Esse eixo define a principal rua interna do novo quarteirão, a partir do qual se ordenam os edifícios e os seus vazios - um largo de topo, um pátio de serviços, ruas internas e um outro pátio/plataforma de uso colectivo ao conjunto habitacional.
A construção é marcada pelo jogo de contrastes materiais da pele edificada: entre as paredes brancas e os corpos de granito do módulo de serviços, às faces internas em placa de fibrocimento, guardas de vidro e embasamento exterior em mármore branco nos edifícios de habitação colectiva.
A hierarquia de espaços beneficia de um conjunto de soluções de desenho urbano tipologicamente qualificadas, com distinção de superfícies materiais em calçada e placas de granito, longas caldeiras rectangulares de separador aos estacionamentos e apontamentos de mobiliário exterior.
Os projectos de Gonçalo Byrne demonstram sempre uma sensibilidade que vai para além das particularidades do desenho, uma inteligência formal que faz sobrepôr os requisitos próprios da sua utência colectiva. É nesse diálogo entre o público e privado que se manifestam dois dos seus grandes momentos - o largo do topo norte que se encerra com a face granítica do bloco de serviços; e a bela plataforma elevada entre dois blocos de habitação, que infelizmente se fecha a um uso semi-privado entre logradouros internos do piso inferior.
Um novo quarteirão que fica, para lá das especificidades próprias, como exemplo de uma boa prática no diálogo com a malha mais antiga que lhe está próxima - e a necessidade de fazer estender cidade valorizando os aspectos de circulação, pedonalidade e vivência comercial que tornam a experiência da rua eminentemente urbana.

Arquitectura: Gonçalo Byrne.
Fotografia: Fernando Guerra.

Gonçalo Byrne Geografias Vivas









Chega ao fim a exposição Geografias Vivas, patente no Centro Cultural de Belém até 25 de Fevereiro. A apresentação de vários projectos de Gonçalo Byrne fez reflectir o extravasar da sua arquitectura para uma dimensão urbana e até extra-urbana – o território da vivência humana.
O conteúdo expositivo incluiu desenhos e fotografias mas assentou principalmente em dois componentes principais: maquetes de grandes dimensões em várias escalas dos projectos representados e projecções vídeo de conversas de Byrne com figuras destacadas como Jorge Sampaio, Vittorio Gregotti, Nuno Portas ou Álvaro Siza.
O discurso oficial do evento remeteu para o facto de não se tratar de uma exposição de arquitectura. Da afirmação sobressai a intenção de fazer prevalecer o discurso sobre a dimensão conceptual. O afastamento a uma mera exibição formal não deixa de evidenciar uma certa ambivalência, a que o domínio das grandiosas maquetes encastradas em volumes negros reforça o sentido de depuração. Existe ali uma moeda de troca estética na formulação dos corredores expositivos, numa série de galerias temáticas que enunciam os temas em presença: Espaços de Relação, Cidade Histórica versus Cidade Contemporânea, Temporalidade, Paisagem e Vazio.

Se as Geografias Vivas remetem para essa dimensão da complexidade urbana, das emanações arbitrárias da vida colectiva, a purificação formal exposta faz prevalecer o tom pausado da sua reflexão teórica. E se, em parte, isso permite compreender com clareza os gestos projectuais de Byrne, torna também distante a leitura da obra acabada.
Bom exemplo desta duplicidade algo contraditória é a mostra da Requalificação da Zona Envolvente à Abadia de Santa Maria de Alcobaça. A dimensão supra-arquitectónica e a aproximação de escalas exposta em duas maquetes contíguas evidencia a beleza conceptual do grande terreiro e a sua relação com a envolvente monumental, reforçada por opções materiais singelas e muito expressivas. Ensaia-se assim um melhor olhar sobre o projecto, mas subsiste o sentir da distância ao real que só a experiência do local pode inevitavelmente obviar.
A metodologia da exposição torna-se mais eficaz para os projectos de base macro-escala, como o caso do Cais do Carvão ou a leitura geográfica do Centro de Controlo do Cais de Lisboa, uma peça tensa em ensaio sobre o vazio. Noutros casos acaba por beneficiar uma tendência para a monumentalização do objecto projectado; atente-se na proposta para o Santuário de Fátima, como exemplo.
Um dos projectos mais interessantes em presença é o da Sede do Governo da Província do Brabante Flamengo, em Louvaina, na Bélgica. É um daqueles objectos em que a relação com uma envolvente urbana sobrecarregada e caótica confere uma unicidade particular, na leitura da torre quadrangular envidraçada e os volumes horizontais que dela se desenvolvem.

Inevitavelmente, o conteúdo doutrinário da exposição extravasa dos depoimentos vídeo espalhados em diversos momentos do percurso, através de caixas negras de projecção. Fica na memória a conversa com Nuno Portas, dois homens dissertando sobre a cidade de interacções e percursos, as tensões entre a contemporaneidade e a história e a inevitável geografia viva da grande construção urbana. Uma de várias participações a reter, a merecer um suporte mais perene que lhes confira registo para o futuro.
Deixo estas impressões com a chamada de atenção a todos os que ainda queiram visitar a exposição, podendo fazê-lo até ao próximo domingo.

Arquitectura: Gonçalo Byrne.
Fotografia: Fernando Guerra.

Open House de Arquitectura





Tive o prazer de estar presente na Open House da Faculdade de Arquitectura da Universidade Católica, em Viseu, na passada sexta-feira. Foi uma oportunidade para conhecer a dinâmica da escola e partilhar algumas reflexões sobre a sociedade em rede, os seus efeitos na nossa forma de lidar com a informação e no modo de pensar e viver as cidades, a arquitectura, o espaço.







Tentei focar alguns aspectos da nossa contemporaneidade hiper-tecnológica, os receios de uma sociedade distópica dominada por um sentido de desadequação, de displacement psicológico bem ilustrado nas imagens macro-escala de David Maisel.
Vivemos numa era de crescente complexidade, um mundo que convida à interactividade, de interfaces abertos à nossa manipulação. Cada vez mais submersivos, estes suportes que nos permitem ver uns aos outros em qualquer parte do mundo, falar, interagir em rede, conduzem-nos também a uma experiência abstracta desse mundo.
São afinal tecnologias que repercutem ambientes sociais mas encerram ao mesmo tempo certos perigos, tornando a existência humana numa experiência híbrida. Um conceito interessante desta dinâmica é o de urbanismo desconectado – o efeito do telefone no espaço público não é o da intrusão pelo toque; é antes, mesmo quando o telefone não toca, o modo como torna o espaço público menos público, o indivíduo social num indivíduo sequestrado. E, de certo modo, o sentido da rua como espaço público, torna-se diminuído.
Deixamos, por via de uma portabilidade intrusiva, de ser indivíduos fixos, discretos, passando a ser nódulos na rede. Eu sou parte da rede e a rede é parte de mim. Sou visível ao Google. Eu linko, logo eu sou.

Cabe-nos reflectir um pouco sobre como esta realidade altera os padrões de comportamento, de uso e mobilidade no espaço. Qual o efeito deste espaço híbrido – um mundo com duas existências, em que as coisas do espaço físico têm a habilidade de ser disseminadas, gravadas ou colocadas no contexto do que acontece na rede? O mundo como base de dados de si próprio, com sub-data acessível por interface móvel em qualquer parte da cidade.
Penso que é importante reflectir sobre estes aspectos sociais da rede, porque as redes não são necessariamente comunidades. A comunidade – em proximidade – é um conceito com uma dimensão qualitativa. Por outro lado, uma rede – network – compreende um grupo ou sistemas de pessoas inter-conectadas. É, antes uma medida quantitativa de proximidade: o número de pessoas e as suas intersecções – nodes.
Ao trazermos para dentro da rede conceitos da linguagem social que lhe são externos, utilizando-os como metáforas de realidades novas, abstractas, estamos a projectar sobre elas uma intenção cultural. Mas existem de facto comunidades na rede, ou antes percepções de comunidade, em que mergulhamos cada vez mais profundamente, cada vez mais sós?

Como contextualizar este não-espaço, dentro e fora da experiência virtual? Dentro do mundo real? Como uma categoria autónoma de espaço, ou um sentido de narrativa abstracta, ficcional, da vida? São ideias que me recordam a Proxémica de Hall. Habitamos lugares – não apenas coordenadas físicas ou zonas de percepção. Os lugares estão imbuídos de significado pela prática cultural; os lugares estão relacionados de formas que podem ou não corresponder ao meio físico ou tecnológico.

Terminei, por fim, a falar um pouco do efeito destas ideias no modo de pensar a arquitectura contemporânea. Julgo que os processos pragmáticos, programáticos, da arquitectura como advogados por Joshua Prince-Ramus por exemplo – em extensão de Koolhaas – exprimem a necessidade de encontrar novas formas de manipulação de informação, de sistematização. São abordagens que tentam compreender a escala de complexidade da cidade. A fazer lembrar também a última Biennale de Veneza - cidades que operam como organismos, capturadas pelo olhar numérico, estatístico, de base sintética. Expressão da urbanidade genérica, a cidade por catálogo, a verdadeira cidade, subproduto da cultura contemporânea.
Prince-Ramus advoga uma arquitectura sem base autoral, antes processada por uma equipa, determinada a sintetizar factores programáticos até à resolução da sua organicidade interna. O resultado é uma arquitectura que não tem assinatura estética. Em vez de forma ou estilo, a REX organiza um edifício pelas suas funções, usos conteúdos – numa teia de relações qualitativas e quantitativas.
Existe, neste momento de incerteza conceptual e transição tecnológica, uma necessidade de dramatizar algum pragmatismo, uma perspectiva historicamente informada que mapeie o meio termo sensível entre a euforia e a inquietação geradas pelas novas manifestações arquitectónicas, urbanas, sociais. Cabe-nos dotar a sociedade de uma capacidade de compreensão por estes novos lugares da experiência humana; conciliando o lugar do económico, do político, do social, do cultural, e mediando os seus valores por entre os efeitos do suporte tecnológico híbrido e em permanente mudança da nossa existência.

Referências: David Maisel, Ryota Kuwakubo, Jeff Han, Hiroshi Ishii, Vito Acconci, Disconnected Urbanism, I link, therefore I am, Edward T. Hall, ArtFutura, Biennale di Venezia, Rem Koolhaas (OMA), Joshua Prince-Ramus (REX).

Arquitectura e interioridade em Citizen Kane



Com o texto Arquitectura e Interioridad en “Ciudadano Kane” de Orson Welles, o Trance Arquitectónico pretendia iniciar uma série de artigos sobre a relação entre o cinema e a arquitectura. Apesar de, até agora, o texto não ter merecido continuidade, vale a pena percorrer esta incursão sobre Xanadu e o estranho mundo de Foster Kane.

Citizen Kane é um filme que marcou a história da cinematografia. Ainda hoje considerado um dos melhores filmes de sempre, é conhecido pelas técnicas revolucionárias de filmagem, entre as quais o famoso deep focus, a focagem em profundidade conseguida muitas vezes pela super-imposição de imagem – dois planos justapostos em pós-produção fotográfica.
As imagens da obra de Welles capturavam uma nova dimensão psicológica e mesmo onírica, com ângulos baixos e contraste forte, criando a arquitectura e impressiva e perturbadora do castelo de Xanadu.

It's a link party!

O Neorama é simplesmente excelente. Do Brasil chega esta selecção cuidada de arquitectura e design para visitar todos os dias.

A Espanha é também uma fonte inesgotável de blogs interessantes. O con-form@ é um bom exemplo, mantido por um estudante de arquitectura de Valência. Recomendam-se as reportagens a preto e branco, com Chipperfield em destaque.

Dois fotoblogs a não perder: Replicação e Doze-Dezanove.

Lost films, imagens reveladas de negativos esquecidos no interior de máquinas antigas.

Quem perdeu o link no Abrupto não deve deixar de visitar a galeria online da British Library. Oportunidade para folhear, literalmente, as páginas de alguns dos mais notáveis livros da nossa História.

O Life*Fever segue em alta na sua nova versão. Foco para as reportagens de moda.

Estéticas de transição




A imagem acima é uma página manuscrita de Os Contos De Cantuária de Chaucer. A segunda imagem é a reprodução de uma página do primeiro livro impresso, a Bíblia de Gutenberg. O que ressalta das duas imagens é a sua proximidade estética. Após a impressão, a Bíblia foi ilustrada de modo a assemelhar-se ao tipo manuscrito – resultando o mesmo tipo de letra, de estrutura de caixa de texto, de decoração envolvente. Sobressai assim o poder da continuidade.

Existem vários exemplos interessantes deste tipo de estética de transição. O desenho dos primeiros automóveis é outro exemplo curioso, esteticamente semelhante aos carros movidos a cavalo da época. Mais interessante, muitos automóveis preservaram, durante mais de 20 anos, um apoio acessório para suporte de chicote.
Nada na tecnologia automóvel requeria esta obediência a modelos antigos de transporte. Mas a inovação parece ser conformada e constrangida pela história, por formas herdadas de pensamento e experiência. De certo modo, a própria estética estabelece a ponte com o passado.

Para a compreensão do mundo de hoje usamos uma linguagem criada para o mundo de ontem. E afigura-se-nos que a vida do passado parece corresponder melhor à nossa natureza, pela única razão de corresponder melhor à nossa linguagem. (Exupéry)

Socks



Começo a pensar que criei um monstro. Ainda a propósito da pequena - pensava eu - provocação a respeito do artigo do Sol, vai por aí grande comoção numa montanha de blogs amigos que levaram a sério a micro-causa. Não sei se é caso para tanto, mas por certo quem anda à chuva molha-se e a autora não me merece grande consideração. A verdade é que à sua conta acabei a comprar duas edições seguidas do semanário das tias. Credo, já não me lembrava daqueles editoriais soporíficos do José António Saraiva. O homem é pior que o La Palice nas suas dissecações da coisa política. Oh meu Deus porque me fizeste tão belo. Compensação, o Expresso melhorou decididamente com a saída. Mas chega de fait-divers que há muita arquitectura para pôr em dia.
É Carnaval e com sorte ninguém leva a mal. Fica a fotografia de Bill Clinton com o seu Socks, numa exibição de ordinarice indesculpável. A mim parece-me muito bem.

Casabella 752



Alguém está de parabéns por esta capa e não é apenas Álvaro Siza. Fica a piscadela de olho, muito merecida, para o Fernando Guerra.

Adenda: podem ver a apresentação ao projecto do Pavilhão de Exposições em Anyang feita aqui no blog.



Adenda (2): há 30 novas reportagens para ver no Últimas, um autêntico brain-feeder. Parecem bombocas, recomendo a invasão...

A aldeia mais ecológica de Portugal

Em dia de referendo uma pequena notícia de rodapé terá sido mais ilustrativa do verdadeiro país real do que as horas de debate que o preencheram. Na aldeia de Viegas do concelho de Santarém, os habitantes tentaram boicotar o acto eleitoral como forma de protesto. Queixavam-se pela alegada impossibilidade de construção em vigor na sua localidade devido a restrições resultantes do PDM, motivo para o abandono persistente de residentes, incapacitados de construir o que quer que seja na sua terra. Segundo as suas palavras, a aldeia encontra-se em risco de abandono e desertificação.
O acto eleitoral foi retomado a meio da manhã após deslocação ao local do presidente da câmara de Santarém, Francisco Moita Flores, que conversando com os populares os conseguiu demover da iniciativa de uma forma tranquila. O próprio Moita Flores assina hoje um artigo de opinião no Correio da Manhã em que dá conta das razões dos habitantes de Viegas.
Ao que parece, aquando da realização do primeiro Plano Director Municipal de Santarém lá para os idos de 90, ficou a própria aldeia sob a demarcação da área de Reserva Ecológica Nacional. Assim, por incidência das suas restrições à edificabilidade e as aplicações restritivas que lhe são habituais, os moradores de Viegas vêm-se impossibilitados de construir ou ampliar as suas casas. O espaço ecológico é para proteger e, ao que parece, esta deve ser a aldeia mais ecológica de Portugal.
A pequena aldeia de Viegas vê-se assim numa situação digna dos livros de Astérix, rodeada de um prédio jurídico tão absurdo e paradoxal. O que custa observar afinal não é que uma solução ilógica de planeamento tenha sido instituída. O que custa é ver como, mais de quinze anos e uma revisão do PDM depois, perdura este caso sem que as entidades que tutelam o planeamento local tenham sido capazes de se articular para o resolver. Num país em que tantas vezes os organismos públicos se confrontam em contendas do Estado contra o Estado, não é difícil compreender porquê.

Europan 9



A edição nove do Europan já está em curso. A iniciativa tem como tema a Cidade Sustentável e Novos Espaços Públicos, estando aberta à participação de arquitectos com idade inferior a 40 anos.
O Europan reúne 73 mini-concursos de desenho urbano espalhados por 22 países. Oportunidade para desenvolver uma experiência curricular interessante, com acesso a ampla divulgação mediática e publicação própria, para além de concorrer a um primeiro prémio de 12.000 Euros. Mais detalhes no sítio web do Europan 9.

(via)

Magia quotidiana




Caroline Woolard é designer e artista plástica. Tem por declaração de intenções subverter objectos banais para cultivar magia quotidiana, criando plataformas para uma experiência diferente do espaço entre as pessoas e a arquitectura. Nas imagens acima podem ver duas das suas criações: uma instalação de bancos de descanso colocados em vários pontos da cidade de Nova-Iorque, assentes em peças de sinalética urbana e iluminação pública; e um assento portátil instalável no interior de uma carruagem de metro. No seu blog podem encontrar um filme desta sua segunda proposta em acção, entre detalhes de muitas das suas outras ideias.

A Barriga De Um Arquitecto no novo Blogger

Por favor apertem os vossos cintos porque o blog está em vôo para a nova versão do Blogger. Esperam-se algumas complicações pontuais, caracteres estranhos e outros fenómenos de origem desconhecida. Tudo voltará ao normal tão cedo quanto possível. Boa viagem e voltem sempre.

Web 2.0

Um pequeno filme intitulado Web 2.0... The Machine is Us/ing Us incentiva a repensar valores sociais e humanos perante uma experiência subjectiva do mundo radicalmente alterada pelas tecnologias da comunicação. A autoria é de Michael Wesch, Professor Assistente de Antropologia Cultural na Kansas State University e promotor do grupo de trabalho online Digital Ethnography.

Vontade de dar um pontapé (na etiqueta)



O Sol quando nasce não é para todos. Não será para cães e gatos, a julgar pela classe refinada da Sra. Assunção Cabral, cronista de etiqueta do novo semanário. Numa explanação de elevado bom gosto, ei-la a erguer sua caneta para exprobrar toda a maldade felina.
Os gatos são traiçoeiros, afirma. E é bem verdade, a julgar pelo meu siamês que ainda nem há três dias me saltou para o colo quando nele repousava um pratito de sopa. E já se sabe que sopa entornada não é de bom tom. Há que manter a panache, remetendo as terríveis criaturas para a sua sordidez natural. Imagine-se, sim, os bichanos - como diz - roçando-se nas pernas a pedir leve carícia. Oh, a tragédia, o horror. Isso é coisa de pató, pois o que é de berço é enxotar o pequeno monstro a pontapé.

Oh, por fa, haja alguém lá para as bandas do Sol a apagar a luz a esta senhora, que de tantos pudores higiénicos até dá vontade de dar um pontapé – na etiqueta, que eu também sou gente de bem. Não lhe desejo por isso o desabrigo e violência a que são sujeitos os animais no nosso pequeno país. Distante, é certo, dos possidoníssimos dos ingleses que subsidiam uma instituição como a RSPCA, que gere entre muitas coisas um corpo de inspectores próprios que dão seguimento a denúncias de maus-tratos e abandono de animais.

Por isso, olhe querida Assunção, e porque gostamos muito de si, abro aqui uma pequena micro-causa deixando o seu email e pedindo a todos os interessados que o divulguem e lhe enderecem as suas carícias felinas. Eu serei já o primeiro.

Para: assuncao.cabral@sol.pt, opiniao@sol.pt, cartasaodirector@sol.pt.

Renzo Piano Braço de Prata Housing Complex







Poucos conhecerão o plano de Renzo Piano para um complexo residencial na zona do Braço de Prata, em Lisboa. O projecto remonta a 1999 e integrava uma vasta reconversão urbanística da área afecta a um conjunto de pavilhões industriais em desuso.
A proposta esquematizava a apropriação da estrutura em rede do edificado, introduzindo novas acessibilidades diagonais e transversais que davam corpo a um sistema de vias e percursos pedonais. Os novos edifícios definiam uma gradação hierárquica de espaços públicos e semi-públicos, criando condições de amenidade e habitabilidade muito particulares à tradição lisboeta, segundo Renzo. Complementarmente, avançava-se um traçado de recuperação da frente ribeirinha e a consolidação de novos espaços de utilização colectiva.
O projecto é apresentado no seu sítio web e constitui a única obra do arquitecto em território nacional. Infelizmente, até hoje, ainda não se tornou realidade.

Arquitectura: Renzo Piano.

The Squid And The Whale



Retrato da desagregação de uma família na Brooklyn dos anos 80, The Squid And The Whale (A Lula E A Baleia) conta-nos o trajecto de dois irmãos emocionalmente abandonados à custódia conjunta dos pais. No enquadramento de um fenómeno contemporâneo de fragmentação familiar, o filme faz registo da resistência juvenil à perda das ligações afectivas. A particularidade desta história, baseada na experiência autobiográfica de Noah Baumbach, resulta da crueza de uma envolvente erudita em que se processam erros complexos de interacção paternal. Todo um contexto disfuncional que se transmite nas entrelinhas do comportamento, nos pequenos egocentrismos e indisponibilidades, só aparentemente inócuos.
Os contornos por vezes cómicos deste filme não iludem a natureza dramática das desarticulações que lhe estão latentes. É, afinal, uma composição que aborda as complexidades do crescimento e do divórcio. Que nos mostra, pelo olhar dos filhos, como se cresce sempre - por entre os erros dos pais, os fracos juízos ou as más escolhas. E, no entanto, persiste por entre aqueles dois jovens um fio condutor de afectos capaz de os resgatar ao absurdo da sua circunstância e a uma emancipação que passará, inevitavelmente, pelo enfrentar dos seus medos.
Um grande filme, adulto, por vezes divertido, outras vezes duro, mas imperdível. Ficam as prestações sempre recomendáveis de Laura Linney e Jeff Daniels. Destaque inevitável para os filhos, na interpretação de Jesse Eisenberg e Owen Kline, este último filho de Kevin Kline.

Lady In The Water



Terei por certo sucumbido aos encantos de M. Night Shyamalan, aceitando trilhar a viagem das suas muitas fantasias. Perdi de vista, algures no caminho, o momento em que divergi da multidão. Parte daqueles que se fascinaram com O Sexto Sentido não imaginariam o quanto poderiam desdenhar Shyamalan nos anos seguintes. Olhando a imensidão de críticas arrasadoras que os seus últimos filmes têm recebido, talvez tenha chegado a hora de me dedicar a um pouco de psicanálise.
Quando me separei desse grupo, afinal? Em mim não houve surpresa ao descobrir n’O Protegido uma obra superior. Explicá-lo tornou-se impossível a ponto de desistir de tentar sequer. Com Shyamalan passei definitivamente para o outro lado do espelho.
Sinais começava com a imagem de um campo de milho onde o primeiro dos muitos sinais dispersos da história ia aparecer. Vemos o campo através de uma janela da velha casa, os vidros antigos distorcendo a vista, revelando nem tudo ser aquilo que aparenta. Reconheço poucos cineastas capazes de mergulhar de tal forma nessa distorção da lente e do olhar onde se balança a dúvida e a fé. Talvez tudo se resuma ao conflito desse pai, como para todos nós, que a fé não é realmente a ausência de dúvida, mas uma atitude consciente de vontade em aceitar a grandeza do inexplicável nas nossas vidas.
E eis que Shyamalan regressa com A Vila, já rotulado de desastre iminente antes mesmo de ver a luz do dia. E descubro, sem surpresa ou assombro, uma obra-prima. Uma história fascinante pontuada pela iconografia do fantástico, que nos fala da monstruosidade latente no ser humano, da qual ninguém pode verdadeiramente ser salvo. Mergulhei com Ivy no bosque dos medos, perdi-me no fascínio daquelas árvores com seus ramos infinitos, o universo denso e espesso que o podemos sentir com as próprias mãos. E assim chego, ainda mal vislumbrando o céu por entre as folhas da sua última fantasia, a este condomínio dos subúrbios de Filadélfia.
Via Lady In The Water (A Senhora Da Água) e pensava – eis um filme desfazado dos dias que correm. Haverá no mundo inocência bastante para conter tal obra? Eis o mistério de um filme que se constrói sobre a ilusão que habita, como uma chama ténue, a alma de um criador. Disparate ou magia?
As histórias de Shyamalan são um mosaico com muitas peças, entre o que se diz e o que fica por dizer. À medida que as peças se encaixam, eis que se vai revelando uma clareza que ilumina a alma. Este é também um filme de ilusões, correndo na berma dos nossos preconceitos, dos nossos limites. Este é um filme que nos envergonha, porque ao acreditarmos nos expõe.
Poucos cineastas serão capazes de capturar essa ambivalência de uma magia imersa sob o manto do banal. Em tempos, um jovem Spielberg fazia-nos sonhar com um extraterrestre escondido no armário. Que vivam, agora e sempre, os monstros, no armário ou ocultos sobre a relva, as ninfas mergulhadas no tanque da piscina. Que viva, pois, esta Senhora da Água, num lugar especial dos corações daqueles que ainda ousam acreditar.