[quando deus se sente só]

Terça-feira



Nós somos das primeiras gerações da história do homem a ter ao nosso alcance uma visão possível de como se formou o universo. Ainda que milhões de perguntas permaneçam sem resposta, nunca antes se teve uma compreensão tão objectiva do que terá sido o Big Bang de há 15 biliões de anos, uma incrível erupção de espaço, matéria e energia que deu origem ao próprio tempo.
Ainda que imaginar um tal fenómeno nos seja quase inacessível, podemos compreender em abstracto os fenómenos de formação das primeiras estrelas e dos seus colapsos sucessivos que foram gerando os elementos que hoje existem no universo, os tijolos da criação com que se fazem planetas e que nós traduzimos na tabela periódica.

Por vezes sou levado a pensar que a maioria de nós toma isto como uma curiosidade. No entanto, a visão que a ciência nos oferece sobre as nossas próprias origens não é nenhum fait-divers. Pelo contrário, é algo que vai ao âmago da nossa própria existência.
O problema com a ciência é que é quase sempre mal compreendida. Muitos esperam dela respostas para as insatisfações das suas vidas espirituais. Mas a ciência não tem por base as nossas dúvidas filosóficas. Ela não interfere com as religiões nem procura responder a questões metafísicas. A ciência é (tão só) uma ferramenta essencial de conhecimento que se constrói na base de interrogações concretas da realidade observável e experimentável.
Acima de tudo, a verdadeira ciência faz-se de respostas que não são dadas como certas: antes não estão provadas como erradas.

A grande dádiva da ciência à nossa existência é dar-nos o lugar e a escala do homem no universo. Aos que trilham por entre todas as dúvidas esse caminho de descoberta não mais será possível imaginar um Deus à escala do homem, maestro de tempestades e criador de calamidades humanas. A esses não será sequer possível imaginar um Deus, pois que tal coisa, seja o vazio ou o maior mistério, estará sempre para lá de toda a nossa capacidade de sonhar e de toda a nossa imaginação.

[imagem: sometimes even god gets lonely por Tim Cook]

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