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Quarta-feira

Sem nenhuma razão que o justifique (a não ser esta fixação no umbigo) deixo aqui uma listagem de textos anteriores de que continuo a gostar e que julgo ainda merecerem ser lidos. Os títulos são links para os textos completos originais.



|esta|terra|mal|amada|
No entanto, olhados vinte anos depois, quanto custaram esses milhões de contos de poupança estatal, nos largos milhares de acidentes que ali tiveram lugar? Nos custos materiais resultantes directamente dos acidentes? Nos custos em cuidados de saúde dos atingidos, mortos e feridos? E depois, quanto custam os danos pessoais, emocionais, nas famílias das vítimas, os cônjuges, os pais ou os filhos, ou naqueles que ficam atingidos na sua integridade física para o resto da vida. E esse custo, como se repercute em crises, depressões e problemas sociais, em produtividade, nas suas vidas futuras?
Alguém sabe fazer estas contas? Alguém quer fazê-las? Quanto custou ao país, este Verão passado, anos de políticas de incúria e desinvestimento na protecção das florestas? Quanto custou a debilidade de um sistema de manutenção e fiscalização das pontes e infra-estruturas públicas, na noite de 4 de Março de 2001, quando um autocarro se lançou para o vazio das águas do Douro transportando mais de cinquenta pessoas? Quanto têm custado a nossa incúria colectiva, a nossa ignorância e má vontade colectivas?

2004-01-13

|arquitectos|contra|engenheiros|
A realidade é complexa, somos nós que a simplificamos na nossa necessidade de encontrar modelos para estudar a natureza das coisas e desenvolver respostas às questões práticas que se nos colocam. O problema começa quando começamos a pensar as prioridades sobre o nosso ponto de vista específico, desvalorizando os outros pontos de vista como algo que “depois alguém há-de resolver”. Ao longo do nosso trabalho, facilmente vamos encontrar pessoas que insistem em trabalhar sempre com aquelas variáveis que aprenderam, aplicando-as e fazendo delas doutrina, sem pensar se essas verdades o são quando confrontadas com outras componentes da realidade. Pessoas que depois ocupam cargos onde emitem pareceres e tomam decisões que afectam conjuntos largos de cidadãos. É preciso combater essa postura, e esse combate devia começar nas escolas e nas universidades, mas para combater um problema é preciso estar consciente de que ele existe. O que fazer então se a falta de consciência do problema é que é o problema?
2004-01-19

|a|arte|de|violar|o|pdm|
Uma das funções dos instrumentos de planeamento (Planos Directores Municipais, Planos de Urbanização, Planos de Pormenor) é sujeitar à discussão pública as decisões que os organismos públicos tomam em relação ao território. Infelizmente essa discussão raras vezes funciona. Os orgãos estatais, câmaras municipais, etc., quase sempre vêem a consulta pública como um entrave ao processo, uma arrelia burocrática, e não como um momento importante para divulgar e questionar as decisões de planeamento que se estão a tomar.
2004-01-21

|sinais|de|fumo|
Julgo que o verdadeiro confronto que existe na questão do aborto é entre aqueles que vêem a questão sobre um ponto de vista ideológico, uma questão de civilização e de princípios que atira o debate para um patamar de indiscutibilidade, e os que vêem a questão de um ponto de vista pragmático, da realidade social. A verdade é que, com criminalização ou sem ela, o aborto está aí, a acontecer todos os dias.
2004-01-29

|máquinas|de|inquietação|
Seja quem for o interlocutor, uma argumentação não é uma luta, não é uma forte asserção emocional, mas a progressão de ideias desde as premissas até à conclusão. Numa abordagem racional, essa argumentação começa com pressupostos, os dados que acreditamos serem certos, desenvolvendo uma racionalização até alcançar conclusões. O discurso da inquietação é um discurso que tenta perfurar a razão do receptor através do apelo à sua emoção. O perigo reside na força que um tal apelo é capaz de gerar, sem que o receptor questione genuinamente as motivações que o levam a aderir.
2004-01-30

|esperança|
O que preocupa é que, enquanto se paga o POLIS, continuam a cometer-se os mesmos erros de planeamento urbanístico ao nível do fazer cidade nova, por todo o país, erros que nos obrigarão a pagar os POLIS do futuro e que hoje bem podíamos estar a evitar cometer à partida.
2004-02-10

|intraduzível|2|
A morte não espera por nós, não espera que completemos a nossa lista de coisas para fazer. A morte não aguarda por pedidos de desculpa ou declarações de amor. Chega, e pronto. Será que as coisas mudam por sabermos que vamos morrer. Porque eu vou morrer. E tu vais morrer. Não tenhas dúvidas. Será que isso nos deve fazer mudar?
A liberdade vem de dentro - freedom is from within - disse Frank Lloyd Wright. Isso é tudo. Desde que abrimos os olhos pela primeira vez, tudo é ganho, tudo é lucro, mesmo a dor.

2004-02-13

|casamento|e|adopção|gay|
Existe um problema com a nossa sociedade, que é o de não exprimir em relação a cada um de nós uma verdadeira preocupação com o bem estar, se somos felizes, se sentimos estar a fazer as escolhas acertadas para a nossa vida. No entanto, já lhe é relevante aquilo que fazemos, com quem o fazemos e porquê. Ora o amor, nas suas várias formas, é um bem precioso.
2004-02-27

|transcender|
O modo como projectamos o espaço define o que somos enquanto humanos. Por isto saímos da caverna, porque já não nos revemos nela. E por isso a arquitectura não é uma arte amordaçada. O que a define é exactamente o homem. O que define uma porta é o homem a passar nela. Se não passar não é uma porta. Há quem encontre nos “constrangimentos” da realidade um espartilho para a sua imaginação, ao ponto do próprio cliente se tornar num constrangimento do artista. Esta atitude não tem nada de erudito, é uma mentira. Não tem nada que ver com arte, nada que ver com liberdade. É tão absurda como dizer que as regras da gramática são um constrangimento para o escritor ou para a literatura.
2004-03-09

|o|cão|com|três|patas|
O resto da história é fácil de adivinhar. Dois anos depois, eu e a minha mulher somos os felizes donos do Moby, o cão com três patas, crescido, viçoso, que corre, sobe e desce escadas como qualquer outro. Um cão com três patas é um sobrevivente. A prova, de que a vida é difícil. E no entanto, por vezes, saltando para alcançar um biscoito ou correndo a brincar com outro cão, torna-se gracioso, como se uma quarta pata subitamente invisível aparecesse novamente. E faz-me lembrar, quando a vida parece afundar-se em problemas, que com esperança e alegria de viver todas as dificuldades se ultrapassam, e tudo se conquista.
2004-03-18

|à|espera|do|desastre|
Apesar de não se poder prever a ocorrência de um sismo, as suas consequências podem ser minimizadas. As acções preventivas podem e devem fazer-se a vários níveis, tanto no planeamento e construção urbanística, como ao nível da protecção civil e da sensibilização da população geral. Infelizmente, verificamos que em Portugal os erros se cometem em cima dos erros, silenciosamente satisfeitas as diversas entidades uma vez que “a lei é boa”.
2004-04-02

|vida|contemporânea|
Ontem parávamos na montra da loja de electrodomésticos para nos vermos aparecer naquela televisão com máquina de filmar ao lado. Amanhã teremos a cara espalhada por toda a parte sem ligar a isso.
2004-06-18

[esta terra mal amada – 2]
Richard Feynman termina esta história com duas evidências. Em primeiro lugar que o cientista, pela sua abordagem que parte de observar a realidade e os fenómenos concretos que aí se verificam, é aquele que dispõe da melhor metodologia com vista à resolução dos problemas. Em segundo lugar, outra evidência, que este cientista nunca ganhará as eleições.
2004-07-30

1 comentário:

  1. já algum tempo que 'viajo' por este blog.
    TEm assuntos dos quais me interesso bastante, outros mais ou menos, outros menos.
    De todos, fico vidrada sobre os teus textos de arquitectura. Porque é tb a minha vida, ou vai ser...
    BEm, o que eu queria comunicar, é que lá no meu cantinho ando a tentar mudar um bocadinho as mentalidades do povo.
    "A arquitectura é uma arte, mas uma arte pública. A maior parte das vezes o público não escolhe a arquitectura como escolheria um museu para visitar. Assim, a arquitectura é-nos imposta na nossa vida quotidiana, nas nossas casas, nos lugares de trabalho."
    Sendo assim, sei la...
    Tou contigo a remar no mesmo barco.
    E se quiseres ajudar, passa lá e diz de tua justiça...

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