Por amor de Deus



De George Bush podemos esperar tudo. Por isso, a sua intenção em apoiar o ensino da teoria do “intelligent design” lado a lado com a teoria da evolução das espécies de Darwin nas escolas talvez não seja assim tão surpreendente. No entanto, ao ler no Afixe uma reflexão que se pretende racional discutindo evolucionismo e criacionismo como se fossem coisas ao mesmo nível, tenho de dizer que fiquei baralhado. Explico porquê...

A evolução das espécies resume-se a isto: os organismos reproduzem-se. Devido aos mecanismos genéticos que sustentam a reprodução, alguns espécimes nascem melhor adaptados ao seu ambiente e como tal a sua proliferação é mais bem sucedida. Os genes destes vencedores tornam-se assim mais comuns na geração seguinte. As mudanças de sucesso são acumuladas, o que origina o aparecimento de novas espécies através de um processo de selecção natural.

É compreensível que alguns achem discutível o facto de que somos descendentes dos macacos. Suponho que essas pessoas nunca tenham visto o “Fiel ou Infiel” na TVI. Seja como for, intitular o “intelligent design” de “teoria” ou “desentendimento científico” com a evolução é uma grande “pile of bull” como diriam os nossos amigos americanos. Os seus defensores advogam que a teoria do I.D. defende que certas características do universo e das coisas vivas são melhor explicadas por uma “causa inteligente” do que por um “processo indirecto” como a selecção natural.

Apesar de se distanciar de algumas armadilhas da defesa do criacionismo, o autor do texto do Afixe subscreve uma declaração interessante de João Paulo II. Diz ele:
A evolução dos seres vivos, de que a ciência procura determinar as etapas e discernir o mecanismo, apresenta um finalismo interno que suscita a admiração. Esta finalidade que orienta os seres numa direcção, da qual não existem padrões nem responsáveis, obriga a supor um Espírito que seja o seu inventor, o criador.
O problema na defesa desta visão supra-orientadora do processo de evolução das espécies é que é alheio aos básicos da transformação genética. Porque essa proliferação dos mais adaptados resulta de um processo de grande desperdício genético, ou seja, do constante desaparecimento de espécimes menos aptos ou variações de código que se perdem por força da sobreposição das características dominantes. Isto não tem nada de moral: é a natureza das coisas. Uma natureza que nos ensina que somos humanos em resultado de um longo e tortuoso processo de transformação, no qual muitas linhagens se perderam pelo caminho. Está por apurar como é que George Bush sobreviveu.

Einstein defendeu a dimensão sublime do divino. Penso que não estaria a querer dizer: ”maravilhem-se na vossa ignorância”. Não se pode dizer que se tratam de teorias diferentes baseadas em metodologias diferentes, pela simples razão que a montanha de provas científicas em torno da evolução natural é inequívoca; e por isso considerada como fundamental em biologia.
Os defensores do I.D. trazem agora um “package” mais adaptado aos tempos que correm: colocaram na gaveta os sete dias da criação, o Adão e Eva e a arca de Noé. Mas ensinar o “intelligent design” nas escolas é nada mais que promover uma falsificação histórica. Não passa de uma forma de doutrinação político-religiosa. Claro que reconhecê-lo é reconhecer que não existe nenhum ensino que esteja isento de doutrinação. Num mundo em que a realidade é constantemente distorcida em benefício das teses de cada um é natural que a ciência esteja a perder terreno perante a impostura e o fanatismo. Evolução? Penso que somos bem capazes de ficar por aqui.

4 comentários:

  1. É facilmente compreensível que num estado como os EUA existam ambiguidades deste género. Fanáticos da máxima "In God We Trust", pretendem paralelamente estar sempre na vanguarda da Ciência. Como tal criam uma "ponte de ligação" que suporte o paradoxo das duas teorias e chama-lhe ID!
    Recriam a história dentro da própria historia e sobretudo reinventam-na. É o caso do Estado do Texas,(claro), que omite deliberadamente nos livros para as suas escolas secundárias, o factor histórico que passado um século da chegada dos colonos aos EUA, 95% da população nativa foi dizimada pelas doenças levadas pelos europeus. Na altura, um reverendo escrevia para a Europa que tal extermínio dos índios devia-se a "um sinal milagroso de Deus"...

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  2. as invenções da igreja romana são muito divertidas. o culto mariano e a concenpção imaculada tb são fantásticas criações literárias. sem esquecer o celibato de cristo, o homem cuja mensagem foi traída e distorcida pela igreja romana. enfim, um lobby como os outros, que recusa permitir que a religião seja uma questão pessoal sob pena de perder o seu tacho.

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  3. Se a teoria criacionista, em que se inspirou o "intelligent design" que defende, entre outros absurdos a origem divina do homem é ridícula, é igualmente incompreensível o impulso atávico que leva muita gente a considerar inquestionável a origem simiesca do homem.
    O branqueamento da história da evolução acontece quando ao não se considerar vital a descoberta do "elo de ligação" entre homem e símio, se desvalorize o facto de isso até agora nunca ter sido conseguido. Mas há mais. Aconselho-o a ler, por exemplo, a teoria do macaco aquático da galesa Elaine Morgan e a entender o porquê da polémica que tem levantado ao longo dos anos.
    Para começar.

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  4. Realmente a evolucao existe, nos evoluimos sempre que a nossa mente estiver liberta de fanatismos e fundamentalismos. Eu pessoalmente creio que a especie humana tem evoluido sim mas de um animal que embora parente do macaco era completamente diferente pois ja tinha inteligencia, e se assim nao tivesse sido hoje nao haveria macacos eramos todos humanos.

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