A problemática da “capinha”

A pergunta que me ocorre sempre que tenho de licenciar um projecto fora do meu “concelho normal de acção” é o porquê da não uniformização dos processos de aprovação a nível nacional?
Podemos iniciar este debate pela simples organização dos processos de arquitectura.
Numa determinada Câmara do Norte do país pedem-nos um corte da fachada virada para a via principal, noutro muito perto três exemplares de todo o processo sendo um deles em papel vegetal, ali a vinte minutos temos de entregar uma disquete da planta de implantação, sim leram bem uma disquete, o meu computador já nem aceita disquetes, perguntei se podia ser em cd, dvd ou por e-mail a resposta foi negativa porque o regulamento da referida câmara dizia muito claramente disquete.
Para terminar numa Câmara muito perto do Porto perguntaram-me pela “capinha” do processo. Julguei estar perante uma brincadeira da pessoa que me atendia, mas não, naquele concelho todos entregam os processos de arquitectura em capinhas. (…)

Transcrevo parte de um comentário deixado em sequência do anterior texto O grande licenciador, onde o poderão ler na totalidade em conjunto com diversas reacções sobre as muitas complexidades que rodeiam o licenciamento municipal.
A pergunta deixada sobre a não uniformização dos processos de aprovação a nível nacional merece, pela minha parte, este destaque. Ocorre-me apenas que, entre nós, o mais elementar bom senso não é garantia de unanimidade. Concordo que existe um caminho a ser feito pelos profissionais e pelas ordens que nos representam. Fica a leve esperança de que possamos estar a contribuir para dar os primeiros passos na direcção certa.

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Jorge Graça Costa: Casa DT








A edificação tem impactos muito variados sobre o ambiente. Na escolha de materiais e processos construtivos estabelecem-se consequências quanto a métodos de extracção dos seus componentes, aos mecanismos da sua transformação, a gastos de energia e emissões associadas, e posteriormente quanto a requisitos de manutenção, demolição, reciclagem. No entanto, raras vezes essas preocupações são consideradas por aqueles que promovem os edifícios ou pelos técnicos que os projectam.
O ambiente construído é um bem relativamente duradouro. A maioria dos edifícios dura muitas décadas, tornando-se importante considerar desde o início o seu longo ciclo de vida. As decisões de projecto não devem por isso reflectir apenas a tentativa de minimizar os custos iniciais da construção, pois vão afectar os consumos de energia que dela vão resultar, a sua capacidade de resistir aos factores de exposição natural e envelhecimento; e até quanto à sua adequabilidade a novos usos não previstos.
A questão da energia é, de todas estas, uma das mais prementes e ameaçadoras para a manutenção de uma boa qualidade de vida. A pressão exercida pelo preço dos combustíveis, as flutuações na oferta e as considerações ambientais que lhe estão associadas fazem com que também na arquitectura este seja um tema merecedor de crescente atenção. Os edifícios consomem uma boa fatia da produção energética de cada país. Melhorar a eficiência dos edifícios quanto ao seu aproveitamento é por isso um objectivo que ninguém pode descurar.
A adequação do desenho de um edifício a características que proporcionem uma melhor eficiência energética não requer necessariamente o aumento significativo de custos de construção. Muitos dos princípios que hoje se categorizam no âmbito da sustentabilidade reflectem preocupações de relação com o território sempre presentes na arquitectura. Mas exige-se hoje que essa prática não dependa apenas de uma intuição empírica, traduzindo-a tanto em conhecimento técnico sistematizado como numa maior exigência quanto aos padrões de qualidade que tutelam a indústria da construção.

A Casa DT, situada em Oeiras, é um exemplo interessante de um projecto que reflecte na sua base muitas destas preocupações. Projectada pelo arquitecto Jorge Graça Costa, trata-se de um objecto compacto que integra tecnologias de construção acessíveis com soluções de desenho adequadas ao enquadramento local, às suas características de exposição e clima.
Este jovem arquitecto português interessou-se desde cedo pela importância da sustentabilidade e eficiência energética em arquitectura. Desenvolveu um trabalho de investigação na área da arquitectura bioclimática, sendo igualmente premiado em diversos concursos nacionais e internacionais. Destaca-se, como mais notável, a medalha de ouro recebida em 2005 no concurso internacional de design promovido pela Fundação Japonesa de Design - exactamente sob o tema «Energy – Sustainable and Enjoyable Life».
O projecto da Casa DT demonstra bem como a eficácia energética resulta não tanto da exibição de meios – tecnológicos ou materiais - mas da sua capacidade em responder racionalmente às muitas exigências que a vivência humana lhe coloca. A casa está implantada num topo de colina com vistas desafogadas sobre a paisagem, o que permite explorar a relação de vistas e o contraste entre espaços sociais (nível inferior) e espaços privados (nível superior) – conjugados em dois volumes que se destacam e servem de motivo à composição. Tomando por base a configuração regular do lote, o edifício acaba por definir-se como objecto simples e compacto, sobressaindo a expressão da estrutura visível e a diferenciação de materiais utilizados. O desenho reflecte preocupações de utilização racional da energia quanto à relação do volume interior de ar e ao funcionamento passivo do edifício no aquecimento e arrefecimento, sem dependência regular de tecnologias activas para manter níveis de conforto satisfatórios. A iluminação natural é potenciada pelas aberturas mais generosas que servem o piso térreo, onde se localizam as zonas de maior permanência, e a iluminação artificial assenta em sistemas de baixo consumo.
Dos traços de concepção da arquitectura à definição adequada de soluções complementares mais específicas, a Casa DT demonstra que é possível conjugar as particularidades locais a materiais e tecnologias contemporâneas, garantindo a coesão entre bom desenho e bom conforto humano. O resultado é notável pela simplicidade, sentido de economia e racionalidade na gestão de recursos, em respeito pelos valores maiores da sustentabilidade ambiental que a motivam.

Jorge Graça Costa: DT House
The act of building has multiple impacts on the environment. There are many consequences to the kind of constructive processes and components applied in architecture: from the extraction of raw materials, transformation and manufacturing impacts, to energy costs and associated emissions, following to requirements on maintenance, demolishing, recycling. And yet, often, these factors are not considered by those who promote buildings or by those who design them.
The built environment is a long-lasting resource. Most buildings survive for many decades. Therefore, it is important to consider that long life-span, right from the beginning. Design decisions shouldn’t reflect a simple attempt to minimize initial construction costs; since those decisions will affect its future energy demands, its resistance to aging and other natural factors, its adaptability to alternate, unpredicted uses.
Energy is a pressing issue regarding the maintenance of a good standard of living. Fuel prices, fluctuations in demand, environmental implications, are among the many factors that have contributed to a new global awareness. Since buildings absorb a great deal of every country’s energy production, architecture is now becoming a central discipline in the debate for sustainability.

The DT House is an interesting example of applied energy-efficient principles in architecture. Designed by Jorge Graça Costa, it’s a simple, compact object that integrates accessible construction technologies with smart design solutions.
This young portuguese architect was soon interested by the implications of sustainability and energy efficiency in architecture. He developed an investigation practice in the field of bio-climatic architecture, receiving several awards for national and international competitions. Most noticeably, he won a gold medal for his participation in the International Design Competition Osaka 2005, promoted by the Japan Design Foundation under the theme «Energy – Sustainable and Enjoyable Life».
The DT House project was built on top of a hill, benefiting from open views over the surrounding landscape. Its composition explores the contrast between the social areas of the lower level and the private areas located on the upper floor. These result in distinctive volumes that are enhanced by the visibility of its structure and the different materials applied as external texture.
The design reflects the requirements of rational energy use, integrating solutions of passive cooling and heating as an alternative to more active, energy-dependent technologies. Natural lighting is also enhanced to better serve the lower level, where the social, collective functions, are located. Artificial lighting is supported by low consumption systems.
From the architectural design to the adequate definition of particular solutions, the DT House shows that it’s possible to integrate contemporary technologies and sustainable design solutions – good design as the support to good human comfort. The result is remarkable for its simplicity, sense of adequacy and economy, respecting the greater values of environmental sustainability that served as inspiration.


Architecture: Jorge Graça Costa.
Photography: Fernando Guerra (FG+SG).

Quatro anos



Os blogs pessoais são, de facto, como as pessoas. São afligidos por toda a espécie de flutuações e estados de espírito. O ano terminou com uma nota feliz. Fui recentemente recompensado com um segundo lugar na escolha de Melhor Blog Português 2007, na categoria de design.
Ao olhar para este último ano de blogging, parece-me ter sido bastante irregular. Por mais que goste de o fazer, a vida por vezes encontra formas de se meter pelo meio dos meus planos. Ainda assim aconteceram coisas interessantes. Talvez o mais empolgante tenha sido a oportunidade de participar na Trienal de Arquitectura de Lisboa, que providenciou algumas experiências enriquecedoras bem como vários meses de agitação. Tive igualmente a satisfação de me ver incluído na lista do Eikongraphia MoPo 2007, o que me motivou a inclusão de textos em inglês – algo que estava a considerar há já algum tempo. Mas a surpresa maior terá sido o convite para uma entrevista endereçado pelo Pedro Rolo Duarte. Foi uma oportunidade para conversar sobre alguns dos temas que por aqui vão passando, desta vez numa plataforma bem diferente.
Quatro anos passaram desde que comecei A Barriga de um Arquitecto com uma das minhas frases preferidas do Richard Feynman. Tem sido uma viagem longa e cheia de peripécias. E no entanto, não consigo deixar de pensar numa outra das suas referências sábias: «O princípio mais importante é que não te deves iludir a ti próprio – e tu és a pessoa mais fácil de iludir». Assim começo este novo ano com o desejo de tornar este blog maior e melhor, e com aquele anseio habitual em refazer o template, todo de novo outra vez.

Four years
Personal blogs, I suppose, are like people. They’re afflicted by all sorts of moods and floatations. The year ended on a happy note, as I was recently rewarded with a second place on the Best Portuguese Blogs 2007 competition – design category.
As I look back to this past year of blogging, it seems to me that it was highly irregular. As much as I love this blog, life sometimes gets in the way. Still, interesting things happened in 2007. Most noticeably, I took part on the Lisbon Architecture Triennale, which provided an enriching experience and a few hectic months as well. I was also fortunate enough to be enrolled in Eikongraphia’s MoPo 2007, encouraging the inclusion of english posts - something that had been on my mind for a while. But the year’s most surprising occurrence was probably the invitation for a radio interview (portuguese only) addressed by Pedro Rolo Duarte. It was an opportunity to talk about some of the issues that have been at the heart of this blog, this time on a different platform.
Four years have passed since I started The Belly of an Architect with one of my favourite quotes by Richard Feynman. It’s been a long and enriching journey all along. Still, I can’t help thinking about another of his wise references: «The first principle is that you must not fool yourself - and you are the easiest person to fool». And so I begin this new year with the wish to make it bigger and better, and that seemingly ongoing urge to change the template, all over again.

O Lugar dos Ricos e dos Pobres no Cinema e na Arquitectura em Portugal



Decorre na Cinemateca o ciclo “O Lugar dos Ricos e dos Pobres no Cinema e na Arquitectura em Portugal”. O evento vai estender-se até Março de 2008 e conta com a colaboração do Núcleo de Cinema da Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa.
A próxima sessão é já esta Sexta-Feira, 21 de Dezembro às 21:30, com a exibição do filme Peixe Lua de José Álvaro Morais, seguido de debate que contará com as presenças de Luís Miguel Cintra e do Arq. João Luís Carrilho da Graça.

O LUGAR DOS RICOS E DOS POBRES NO CINEMA E NA ARQUITECTURA EM PORTUGAL
de Outubro de 2007 a Março de 2008
Em colaboração com o Núcleo de Cinema da Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa

Desde sempre no Cinema, como no mundo - nos quartos, nas casas e nas cidades -, os ricos e os pobres tiveram os seus lugares, mais ou menos nítidos: da fábrica de onde saem os operários dos irmãos Lumière ao Xanadu do CITIZEN KANE; dos "lugares de miséria atrás de magníficos edifícios" dos olvidados de Buñuel à Paris dos burgueses discretamente encantadores; da vila dos pescadores de LA TERRA TREMA às villas das condessas, reis e príncipes de Visconti; dos albergues dos pobres de Preston Sturges aos hotéis de luxo de Lubitsch; dos borgate dos sub-proletários de Pasolini aos subúrbios das famílias remediadas de Ozu; das ruas da vergonha de Mizoguchi aos becos e ruelas do ANJO AZUL; da casa da mãe siciliana de Huillet e Straub à Versalhes do Rei Sol de Rossellini; das roulottes dos lusty men de Nicholas Ray à FAT CITY de John Huston; do quarto alugado da rapariga da mala de Zurlini ao palácio dos seus amantes; dos lugares dos criados e dos senhores de Jean Renoir a todos os lugares de Chaplin...
Qual tem sido, em Portugal, o lugar dos ricos e dos pobres no Cinema? Qual vai sendo o lugar dos ricos e dos pobres na Arquitectura? Como é que o Cinema pensa e olha essa Arquitectura? Pode a Arquitectura pensar e construir-se também a partir desse Cinema?
Foram estas questões que levaram o Núcleo de Cinema da Faculdade de Arquitectura da U.T.L. a propor à Cinemateca Portuguesa a realização de um Ciclo de doze filmes, a exibir quinzenalmente entre Outubro de 2007 e Março de 2008. Escolhidos pelo Núcleo, estes são alguns dos filmes mais marcantes que se fizeram em Portugal nos últimos cinquenta anos e, ao mesmo tempo, filmes em que este assunto se encontra reflectido de forma sempre preponderante: dos VERDES ANOS, de Paulo Rocha, à JUVENTUDE EM MARCHA, de Pedro Costa, do BELARMINO, de Fernando Lopes, às RECORDAÇÕES DA CASA AMARELA, de João César Monteiro, dos TEMPOS DIFÍCEIS, de João Botelho, ao PEIXE LUA, de José Álvaro Morais, dos BRANDOS COSTUMES, de Seixas Santos, ao AGOSTO, de Jorge Silva Melo, de UMA RAPARIGA NO VERÃO, de Vitor Gonçalves, a TRÁS-OS-MONTES, de António Reis e Margarida Cordeiro, de LONGE DA VISTA, de João Mário Grilo a O PASSADO E O PRESENTE , de Manoel de Oliveira. E, para continuar o que este Núcleo procura fazer desde que surgiu, em 2005, – aprofundar as relações entre o Cinema e a Arquitectura – o realizador de cada filme, sempre que possível, estará presente no fim de cada sessão para conversar com o público e com um arquitecto convidado, cujo trabalho, reconhecido, tenha passado também, e hoje muito nitidamente – como sempre? –, por pensar e projectar os lugares dos ricos e dos pobres em Portugal.

José Neves, Arq.
Coordenador do Núcleo de Cinema da Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa

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MBP07



Numa nota mais leve, eis que dou por mim nomeado para Melhor Blog Português de 2007 na categoria de "Design". Fico num misto de alegria e estupefacção. Design? Parece-me que gostam mais do meu aspecto do que do meu cérebro. Estou a imaginar por aí muito boa gente a rir às minhas custas. Que seja. À falta de categoria mais específica para arquitectura, não há que vacilar. De resto pareço estar em boa companhia. Ficamos por aqui à espera dos resultados finais do júri. Ó xôr Markl, já agora, sou seu fã e tenho-o na lista há muito tempo. Meta lá uma palavrinha, ó fáxabor...
:)

MBP07
On a happy note, I find myself nominated for Best Portuguese Blog 2007 on the category of “Design”. I’m having mixed feelings of joy and astonishment. Design? It seems that I’m more appreciated for my looks than for smarts. I can imagine a lot of people laughing at my expense. So let it be. Since there’s no specific category for architecture, I’ll take it with grace. Anyway, I seem to be in good company. Let’s wait for the jury’s final call, then.

Sobre «O Dever da Verdade»



O Dever da Verdade não é apenas mais um retrato da situação económica e social portuguesa. É antes um documento que carrega o peso da realidade inescapável de um país à beira de enfrentar a sua verdade histórica.
O livro de Medina Carreira com Ricardo Costa é supreendentemente pequeno. O formato, em misto de diálogo e entrevista, pode fazer passar a ideia de estarmos perante um trabalho de interesse meramente jornalístico, de pouca consequência. Puro engano. Trata-se de um livro lúcido e certeiro, despido de obsolescências. Tudo é substância. E a substância que nele se encerra é o alerta desassombrado sobre a nossa verdade, vedada dos olhos do público pelo soundbyte mediático e vários ciclos de discurso político anestesiante.
A “verdade” de Medina Carreira é que não atravessamos uma crise. Não percorremos sobre qualquer ondulação transitória, normal em economia e recorrente na história das sociedades. Estamos, assim, numa situação mais profunda, cujas raízes se entranham no nosso processo histórico, na herança salazarista, no processo democrático débil, na delapidação de fundos da UE, na repetição de erros políticos, na trágica perda de oportunidades. A situação, afinal, somos nós.
Aquilo que a política tenta travestir como crise é um processo de decadência continuada, política e financeira, cujos efeitos se começam a sentir em sintomas diversificados de desagregação social.
O que está aqui em causa não é mais uma questão meramente ideológica ou partidária – daquilo que gostaríamos de ter ou ser – mas daquilo que podemos fazer face à realidade insustentável que nos cerca. Poderá dizer-se que a “verdade” do retrato testemunhado por Medina Carreira não é absoluta ou dogmática. Que ela encerra margem de erro, de incerteza. Agora o que não pode ser dito, com honestidade intelectual, é que a verdade pode ser isto ou o seu contrário. Entendo por isso que o desassombro deste livro despido de retóricas – tal a força dos factos e dos números – é um testemunho de verdadeiro patriotismo. Que nos coloca perante escolhas – entre a ilusão do discurso transitório e a assunção de uma cidadania avançada capaz de enfrentar os problemas e as dificuldades que nos reserva o futuro próximo.

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Ciclo de Cinema e Arquitectura do IST


PLANOS - Ciclo de Cinema e Arquitectura do IST / NucleAR.